A vida incita, mas eu conjeturo e precipto eventos
Viciado!
Estou ficando doente. Doente por escrever. Uma febre que arde sem arder, contínua descarga elétrica que me coloca na ponta dos dedos.
Começo a ler qualquer (escritor que não lê é escritor morto) livro ou texto e de repente saltam idéias como que de uma cartola mágica. Preciso guardar. Ao registrar, começo a desenvolver e pronto: lá estou eu escrevendo. Não consigo avançar nas páginas dos livros. Mesmo filmes, que gosto tanto, às vezes perco-os inteiros registrando idéias. Só consigo assistir em DVD e sozinho. Ninguém agüenta: paro o filme sempre que me surge uma nova idéia. Crônicas e contos surgem ao andar de ônibus, de avião, ou mesmo a pé nos parques e ruas de São Paulo. Para onde vá, levo caderneta e caneta no bolso.
Poesia é caso a parte. Sempre me pareceu coisa meio suicida; de quem se atira para além da náusea. Às vezes ocorre quando sou atingido pela dor no escuro. Dentro da madrugada de meu quarto sozinho. Talvez em algum gesto inseguro a me lembrar que não abri todos os corações que me cercaram, lamentavelmente.
Poesia é a única maneira que conheço de me levar junto comigo a toda parte. É sempre um alerta de que se não se morre por amor, também não se vive sem ele. Não posso ficar acordado rezando para que vire noite depressa para dormir logo, como na prisão. Não posso apenas cumprir meu destino. A vida incita, mas eu conjeturo e precipito eventos
Às vezes, como agora, só sei o que de fato quero dizer depois que escrevo. Escrever coordena minhas idéias e posso pensar encadeando raciocínios. Estar ao par do que escrevo me faz entender melhor o que vivo, facilitando meus movimentos dentro de mim. No fundo sempre acreditei que escrever é como jogar bolinhas de gude, pião ou empinar pipas. Talvez seja um pouco mais difícil que jogar figurinhas a bafo. Mas garanto: é muito mais fácil que a maioria dos jogos do Playstation.
Adoro escrever, é excitante demais e me deixa a mil por hora. Muito mais louco que cocaína. Fico chapadão. E não dá revertério e nem ressaca. O principal é que no dia seguinte, em vez de uma baita dor de cabeça, tenho um texto, uma história ou uma idéia. Mas percebo que estou obcecado e que esta me prejudicando. Não fico tranqüilo longe de meu micro, meus cadernos de anotações, meus livros e minha tralha de escritor. Já quase não saio de casa. Acordo de madrugada para escrever, converso, leio e vivo só para escrever. Estou em desequilíbrio, viciado, doente.
**
Luiz Mendes
24/11/2010.