Um pai para não esquecer
David buscava informações sobre filha desaparecida no dia dos atentados de 11 de setembro
Agosto, Dia dos Pais. Nem todos merecem presente, mas vamos falar dos exemplares. Era a semana de 11 de setembro de 2001; como jornalista em Nova York, podem-se imaginar as noites não dormidas e o número de horas que a nossa profissão dedicou ao assunto. Na primeira semana concentrei minhas entrevistas no Family Center, um complexo gigante montado na beira do rio Hudson com a rua 55, onde existia auxílio jurídico, psicológico e até coleta de material para testes de DNA. Havia milhares de pessoas com todos os tipos de problema. Entre elas, um certo pai. Sozinho. Chamava-se David.
Ele vestia uma capa de chuva amarela, tinha olhos claros e carregava uma foto da filha, acompanhada de um número de telefone para contato. Ele era um entre milhares de familiares que desconheciam o paradeiro de seus parentes. O “não saber” é uma facada no peito. Sua filha, Melissa, 28 anos, trabalhava havia pouco tempo no 102º andar do WTC 1. Ao falar nela, David fazia acreditar a nós jornalistas que a Melissa, de fato, tinha escapado da torre: era descolada, palavras dele, e chegou a ligar pro número de emergência 17 minutos após o atentado. Eu falei pra ele: “Eu te vi na TV em busca da Melissa”. Ele respondeu: “Falar com a imprensa é a parte boa do meu dia”. Eu estava acompanhada por um fotógrafo belga, e pedi pra ele tirar uma foto daquele pai. A foto ilustrou minha matéria, publicada no finado site No ponto.
Entrevistei tanta gente naqueles meses, vi e ouvi tanta tragédia, por que será que o David foi a pessoa que mais me marcou? Por uma simples razão: a certeza de que o meu pai faria exatamente o mesmo por mim. Deixei a entrevista aos prantos, e nunca mais esqueci. Semanas mais tarde, descobri que Melissa não sobreviveu. Sempre que vou a qualquer memorial, busco seu nome em meio aos quase 3 mil que perderam a vida naquele dia. Menina linda e sortuda por ter um pai fenomenal – como o meu.
Tania Menai é jornalista, mora em Manhattan há 17 anos e é autora do livro Nova York do Oiapoque ao Chuí, do blog Só em Nova York, aqui no site da Tpm, e também do site www.taniamenai.com