The House of Sand
“Que sensibilidade tem essa diretora!”, disse a senhora americana ao meu lado no cinema, enquanto os créditos do filme subiam ao som de Chopin. Pedi licença e interferi: “Desculpe-me, senhora, mas não é diretora, é diretor”, corrigi. “Com esse nome? Com essa delicadeza para retratar mãe e filha? Não pode ser!”, retrucou ela, de cabelos brancos e bengala.“Concordo que esse nome nem masculino é, mas lhe asseguro: Andrucha é diretor. E dos bons.” Estávamos ali para ver House of Sand, ou Casa de Areia, de Andrucha Waddington, estrelado pelas duas belas Fernandas, a Montenegro e a Torres, além de Seu Jorge e Luiz Melodia.
Com uma crítica pra lá de boa do A.O. Scott do The New York Times, o cinema estava quase lotado. E é muito curioso ver a reação do público americano em filmes brasileiros. Desta vez, ri umas quatro vezes enquanto o resto do povo continuava mudo. Como explicar para americanos, por exemplo, que ao longo dos anos o dinheiro desvaloriza, as notas mudam de tamanho, de cor e de nome? Nem Pedro Almodóvar seria tão criativo. Eles riram, sim, na hora em que um violinista tocou uma música judaica no meio do “deserto” brasileiro – cena, inclusive, usada no trailer. Uma mulher também deixou escapar um “uau!!” na primeira cena de sexo, o que me deu vontade de falar: “é amiga, no Brasil é assim, não tem pra ninguém!”. E os créditos? Baiano, Lika, Primo, Careca, Bené. Assim, gente sem nome nem sobrenome. Impossível explicar.
“Essa areia toda aí fica no norte do Brasil”, contei à tal senhora. “Já fui lá, mesmo com o pé direito quebrado e engessado”. A mulher arreganhou os olhos e me fez soletrar o nome do areial: L-e-n-ç-ó-i-s M-a-r-a-n-h-e-n-s-e-s. O desafio de fazê-la repetir o nome superou a subida daquelas dunas num só pé, ajudada por dois cavalheiros. Mas ela aprendeu na hora. Só não lhe contei que quebrei o pé ao ser assaltada numa praia de São Luis do Maranhão. Talvez seja essa a coisa mais difícil de explicar.