O grito de Bill Viola
Assistir a filmes propositalmente irritantes é fichinha perto do choro de um bebê com cólica
Lá pelo fim dos anos 80, quando a gente ainda nem pensava em casar e muito menos em procriar, existia uma profissão chamada videomaker. Hoje em dia, essas pessoas são chamadas de artistas e pronto. Os videomakers (geralmente eram rapazes) gostavam de fazer vídeos e também de cultuar videomakers pioneiros e famosos. Um deles é o Bill Viola, um americano que fez um filme chamado The Space between The Teeth. Na curiosa obra, um homem (ele mesmo, o Bill) solta uns gritos a intervalos cada vez menores. Mais tarde, meu marido, um videomaker que virou professor de cinema, me mostrou um curta anterior, de um polonês chamado Wojciech Bruszewski. O filme consistia basicamente em um grito contínuo. Mais 5 intermináveis minutos com uma pessoa gritando.
Muito bem. Eram obras de arte feitas pra incomodar, pra fazer pensar, pra tirar do lugar e até pra irritar mesmo. Sem uma narrativa, só repetição e ritmo. Os videomakers exploraram as possibilidades e os limites da linguagem audiovisual de um lado. E alguns exploraram também, do outro lado, os limites da paciência do sujeito que assistia. Um tipo de fruição estética ao contrário, que é boa quando acaba.
Mas, depois de já ter passado pela experiência de ter um bebê com cólica em casa, uma criança com otite à noite, um menino birrento ou insistente ou uma adolescente monotemática, você descobre que esses vídeos são fichinha. Afinal de contas, só duram 5 minutos, você baixa o som, sai da sala de projeção ou desliga quando quiser. Já a maternidade e a paternidade, essas são artes bem mais complexas.