Na companhia de objetos
A artista plástica Flávia Junqueira é protagonista de suas obras lúdicas construídas por coleções
No universo criativo da artista plástica Flávia Junqueira, 28, referências lúdicas e fantasiosas se misturam aos conceitos de coleção e acumulação. Entre centenas de objetos, a paulistana constrói suas obras e as apresenta através da fotografia. Em comum, elas também trazem a artista como parte de seus cenários.
Sua história com as artes plásticas começou logo que entrou na faculdade, - é formada pela FAAP -, e antes mesmo de sair dela já havia participado de algumas exposições dedicadas a mostrar jovens artistas. Entre os principais projetos e exposições coletivas nos quais participou, destaca a residência RedBull House of Art; a individual Na Companhia dos Objetos no MAC em Curitiba; a coletiva Subjetivo Feminino: una mirada latino americana, do projeto Photo España; e também a participação na exposição Prêmio Energias na Arte, no Instituto Tomie Otahke.
Neste momento, ela trabalha em sua primeira mostra individual em São Paulo, com estreia marcada para o dia 15 de junho deste ano, na Galeria Baró, que a representa.
Para a Tpm, a artista falou da relação com as temáticas que explora em suas criações, e de como é trabalhar com arte no Brasil.
Em seu trabalho duas temáticas são constantes: o universo lúdico, a fantasia e a infância que coexistem com a questão do acúmulo de objetos. É quase como se você fosse uma colecionadora deles. Como surgiu a ideia de abordar os temas? Como você se sente em relação a eles? O foco de meu trabalho neste momento é observar espaços cenográficos que possibilitam o acolhimento, proteção, realização de desejos, rituais e a celebração: algo que teoricamente está mais próximo de uma ficção idealizada do que da realidade. As relações que se estabelecem entre o mundo real e o mundo ficcional me interessam muito, observo em meu cotidiano estes elementos e ao encontrá-los, procuro ampliá-los. Não é à toa que muito de meus trabalhos plásticos se valem de apropriações de objetos infantis, pois na grande maioria das vezes é dada às crianças a maior possibilidade de misturar o sonho com a vida.
Como o dos carrosséis? Sim. Alguns de meus trabalhos atuais tentam se debruçar mais especificamente sobre estas questões. A instalação que desenvolvi em 2011, chamada "O caminho que percorri até te encontrar", foi a criação de uma catalogação de carrosséis na cidade de Paris, que me permitiu observar o cotidiano real da cidade e reorganizá-la através de uma cartografia incomum.
Tpm. Como começou sua relação com a fotografia e como e quando ela passou de registrar imagens pra virar algo muito maior e envolver outras intervenções?
Flávia. Começou de maneira bastante simples: nunca optei por fazer fotografia como uma escolha subjetiva e definitiva. O uso dela veio como maneira de melhor representar o que eu desejava em meus projetos. Todas as ideias que desenvolvo para um trabalho demandam a necessidade de um ou outro suporte específico, por muito tempo a fotografia foi, e ainda é em muitos casos, a melhor maneira que encontrei para realizar o trabalho e comunicar o que preciso.
Viver de arte, ainda mais no Brasil, não é das empreitadas mais fáceis. Como foi tomar essa decisão? Como funciona isso na sua vida? A tomada de decisão não foi fácil, porém inevitável. Como qualquer pessoa busquei notar quais seriam os prós e contras em optar por uma ou outra profissão. De fato não é uma empreitada fácil viver somente de produzir, viabilizar ou vender seu trabalho de arte. E, ao contrário do que muitos dizem sobre o crescimento do mercado da Arte no Brasil, ainda que muitos colecionadores e galeristas sintam-se razoavelmente satisfeitos, não creio que esta mesma reação funcione igualmente para os artistas jovens que estão iniciando.
Hoje em dia divido minha rotina basicamente em duas etapas: elaboro meus trabalhos em meu ateliê e encaminho paralelamente minha pesquisa no âmbito acadêmico, realizando o mestrado em Poéticas Visuais. Algumas maneiras de viabilizar e viver do próprio trabalho são os editais de incentivam a cultura, convites de residências artísticas ou projetos culturais que banquem a produção do trabalho do artista e a venda na galeria. É assim que hoje viabilizo e vivo de meus projetos plásticos.
Por que aparece como parte de algumas imagens? Em alguns momentos é como se você fosse mais um daqueles objetos. Um de meus primeiros trabalhos fotográficos foi a série de 2008, "Na Companhia dos Objetos", em que eu aparecia praticamente com a mesma fisionomia em oito imagens que designavam cenários que catalogavam os espaços básicos de uma casa. A ideia era estabelecer relações entre um excesso material e uma ausência afetiva. Ao me inserir em meio aos objetos íntimos da casa eu tentava estabelecer algumas trocas entre universos aparentemente simples e opostos, mas que em minhas imagens se apresentavam quase sempre juntos.
O uso do auto retrato possibilitou que eu pudesse de algum modo estar junto com aqueles objetos e me "tornar" parte deles em algum momento, o que de fato não acontecia, pois eu era o único elemento estranho por ali. O trabalho ao meu ver se tornava interessante na medida que apresentava contradições na própria necessidade da existência da imagem que não era totalmente coerente. Já a estética do excesso, acúmulo, colecionismo e catalogação surgiu como raciocínio estético para a criação de cada imagem e até hoje continuo desdobrando e produzindo imagens a partir deles.
Vai lá: www.flaviajunqueira.com.br