Modelo e atriz

Vera Barreto Leite relembra os tempos de manequim da Chanel e fala de sua paixão por teatro

por Flora Paul em

“Eu graças a Deus só trabalhei com gênios!”, diz Vera Barreto Leite, animada, ao telefone. Atualmente, aos 72 anos, ela ensaia para a estreia de Estrela brazyleira a vagar - Cacilda!! nos palcos cariocas, peça dirigida por Zé Celso Martinez Corrêa sobre a atriz Cacilda Becker. Mas a frase também se relaciona ao período em que foi a principal manequim da estilista francesa Gabrielle Chanel. É dessa época, entre 1958 e 1963, em que a geniosa estilista montava suas criações diretamente no corpo de Vera, que a mostra “Vera Valdez – O Sol da Maison Chanel” exibe fotografias, no Rio de Janeiro.

Vera, que também já foi Trip Girl na edição #171 da revista, falou ao site da Tpm sobre a experiência de ser modelo, o humor de Chanel e, como não poderia faltar, o teatro, sua paixão – “Atualmente estou mais pra teatro que pra maneca”, brincou.

Como começou sua carreira de modelo?
Quando eu era menina, perguntaram para mim se eu estava interessada em ser manequim. Eu fiquei interessada em saber o que é que era, porque eu nem sabia. Quando minha mãe explicou, eu falei que queria, queria, queria. Ela achou que eu não ia ter a menor chance, eu era aquela menina magricela sonhando com coisas que não eram para ela. Uma amiguinha minha tinha me dito que tinha uma prima que trabalhava na Schiaparelli [marca de Elsa Schiaparelli, estilista italiana], fui lá e pronto. Fui aceita e começou minha carreira.

E como se tornou manequim da Chanel?
Da Schiaparelli eu fui para a Dior e de lá, uma grande modelo, uma mulher linda, a Suzy Rake, me falou de Chanel, me contou quem ela era e que ela estava reabrindo a casa depois de 15 anos de exílio nos Estados Unidos [durante a Segunda Guerra Mundial], se eu não gostaria de conhecê-la. Eu não conhecia a fama de ninguém, eu queria namorar, olhava aquilo pelo prazer de estar trabalhando. Então eu disse “tudo bem, claro”, e aí eu fui, uma menina, de 16 anos. E a Chanel gostou de mim. A Suzy me convenceu de que seria todo um outro estilo, enquanto Dior era uma loja de moda estatal, eu iria trabalhar com uma criadora extraordinária que, realmente, ela ainda é a grande estilista, hoje. Ela reinventou tudo. Invetou a bijuteria, juntou o perfume com a moda, levou a moda para a rua, para ser copiada, pensando no movimento, na liberdade do corpo, mantendo essa coisa maravilhosa feminina. Acho que Chanel é eterna.

Até hoje se fala muito do gênio difícil da estilista. Era verdade?
É mais ou menos o que as pessoas já leram, é isso mesmo. Mas eu tinha uma relação com ela, fui levada por uma amiga dela que ela admirava. Criou-se ali uma relação mais de amizade porque as outras manequins iam oficialmente, procuravam trabalho. A casa estava abrindo, ela chamou as ex-manequins dela que já tinham 15 anos a mais, não eram jovens. Quem trabalhava com moda era meio considerada, assim como no teatro, prostitutas, mulheres de luxo, digamos assim. Então não tinha jovens. Nisso eu fui inovadora, inclusive na França, saiu até uma matéria naquela época e movimentou um pouco a atração para essa brasileirinha, menina, que estava ali. Isso criou um boom e acho que ela já se interessou por quem era aquela moça.

Como foi a sua passagem da moda para o teatro?

Sempre fui e sou ligada a moda, mesmo depois de velhinha já fiz os meus desfiles [risos]. Mas minha paixão é o teatro. Tive uma loja com a Leila Diniz, também fiz a Moda Móvel, uma coisa meio camelô, criações que fazia e vendia em pontos em tal dia, armava na rua. Foi divertido, mas eu não sou boa de business. Eu desenhava, criava, ficava entusiasmada para isso, mas, quando tinha que cuidar, ir a tal lugar, tal dia ai, querida, aí não deu. E eu fui criada no camarim. Minha mãe ia para o teatro trabalhar e eu dormia no camarim. Então o teatro vem do berço, é uma paixão. Eu sempre tentava fazer teatro, mas a moda me chamava, porque eu precisava de dinheiro. Infelizmente quando eu pus pela primeira vez o pé em cena no Brasil, em um papel como protagonista, foi na época da ditadura, dura mesmo, e fomos censurados imediatamente. Chamava-se Juventude em Crise. Aí tivemos a primeira reunião com os estudantes e a classe teatral, depois teve exílio, exílio, Zé Celso lá fora, grupos exilados, a volta ao Brasil. E aí fomos correndo atrás. Ficamos velhinhos, mas estamos aí onde estamos.

E no teatro, você é mais disciplinada?
Opa, e anda uma correira! Estamos estreando agora. Vai ser no Espaço Tom Jobim, que está lindo. O Rio de Janeiro ganhou uma joia. Está muito agradável, cercado por aquelas matas, fiquei encantada. Espero que possamos encantar como ele nos encantou. O Zé Celso foi começando a escrever sobre a Cacilda, os personagens que ela fez, pesquisando a vida dela. E disso tudo criou quatro peças. Saiu um calhamaço. Porque ele é realmente um grande criador. Um gênio. Eu graças a Deus só trabalhei com gênios! Então agora a gente está fazendo a segunda parte de Cacilda, através do que ela sonhava durante o estado de coma. Ela entra em delírios maravilhosos, de repente chega o Pato Donald, chega o Zé Carioca, ela revive a juventude, os primeiros namoros, o defloramento. E toda a história do teatro no período vai sendo contada musicalmente.

Vai lá:

Estrela brazyleira a vagar - Cacilda!! no Espaço Tom Jobim
R. Jardim Botânico, 920, Jardim Botânico, Rio de Janeiro
dias 5, 6, 7, 12 e 13 de setembro às 18h
Quanto? R$ 40 (tem meia entrada para estudantes, idiosos e funcionários do Jardim Botânico)
Tel.: (11) 3104-0678

Crédito: Divulgação
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