Meio século de Barbie
Entre fashion dolls, criávamos histórias de amor, traição, ciúmes e disputa entre amigas
Era o início da década de 70, no Brasil brincávamos com uma versão menos anoréxica e mais juvenil, a Susi, mas elas possuíam Barbies. O corpo da Barbie era esguio, o busto lembrava um tórax de chester, desproporcional à finura da silhueta, seguramente fruto da obsessão americana pelo busto. A Susi foi lançada em 1962 (reinando sozinha até 1985) e respondia mais ao padrão de beleza local.
Barbie e Susi são fashion dolls, minimanequins do mesmo tipo que era usado para difundir tendências da moda, mas estas eram protótipos, não brinquedos. Foi vendo a filha brincar com bonequinhas de papel que a esposa de um fabricante de brinquedos teve a idéia de fazer uma versão tridimensional, para ser vestida e poder encenar com ela tramas de boneca-mulher. Isso constituía uma diferença, pois o padrão (que ainda usamos) eram bonecas “filhas”, um treino para a maternidade e carro-chefe da identidade feminina até então. Com minhas vizinhas, criávamos para essas bonecas histórias de amor, traição, ciúmes e disputa entre amigas. Elas podiam até constituir família, mas estavam ocupadas mesmo era com “eles”. Infelizmente não possuíamos nenhum Ken, então tínhamos que nos contentar com uma Pedrita com bigode e algumas Susis carecas. Mas isso não impedia que nossas histórias de amor fossem calientes.
Bonecas: alter-egos femininos
Entre minha vizinha fascinante e nossas bonecas que já não eram filhas, mas sim alter-egos femininos, fui aprendendo a me maquiar e a querer ser mulher antes ou independente da maternidade. Barbies e Susis são mulheres jovens. Eu não admirava a mãe das minhas amigas pelo bem que administrava sua casa, mas sim pelos seus rituais de beleza. Com as bonecas aconteceu o mesmo.
As mulheres-bibelô dos subúrbios americanos da década de 50 viviam uma vida Avon e eram dedicadas donas de casa. Mas também foi nessa época que sutiãs foram queimados e Betty Friedan as convocou a sair do imobilismo e da depressão. Em suas pesquisas, a teórica feminista questionou o que é que elas querem afinal, já que aquelas que pareciam “ter tudo” sentiam-se tristes. As respostas vieram com o tempo: elas querem realizar-se profissionalmente, constituir uma família que não as abafe como indivíduos, ser atraentes e eternamente joviais. Coisa pouca... Pelo menos, ser jovens e bonitas treinamos com nossas Barbies e Susis.