Literatura e vinagrete

A franco-iraniana Lila Azam Zanganeh lança seu primeiro livro e volta ao Brasil para a Flip

por Gabriela Sá Pessoa em


“Maravilhoso” é a palavra da escritora Lila Azam Zanganeh. Não só a que mais usa para falar sobre todas as coisas, mas também a que resume o sentimento que motiva sua escrita. “Quero continuar pensando em, sabe, por que a [ideia de] beleza é tão importante para definir quem somos”, conta a autora de O encantador – Nabokov e a felicidade, já publicado em seis países e que chega às livrarias brasileiras neste mês.

Em julho, quem desembarca por aqui é a própria Lila. Ela é uma das convidadas da 11ª edição da Flip, em Paraty (os ingressos começam a ser vendidos na próxima segunda-feira, 10). No evento, dividirá com o escritor Francisco Bosco a mesa O prazer do texto para discutir as possibilidades relação entre o leitor e a leitura.

Será a segunda visita dela ao país. Na primeira, em 2012, passou por Brasília, Rio e São Paulo, onde se apaixonou pela Livraria Cultura da Avenida Paulista. “Fiquei simplesmente maravilhada, todas as livrarias do hemisfério norte estão fechando por causa dos e-books e quando eu chego lá... É como se o mundo estivesse começando de novo”, lembra. Mas a grande paixão (aliás, a palavra da qual mais gosta no Português) é mesmo o limão verde. “E vocês têm vegetais tão lindos, e podem por pimenta e limão em tudo. É maravilhoso”, elogia.

Lila não esconde a empolgação em voltar, tanto que está se esforçando para aprender nossa língua. Durante a entrevista por Skype, ela arrisca algumas frases. A sonoridade é impecável, mal dá para acreditar que ela havia começado a estudar Português apenas no começo deste ano: “Quero conseguir conversar no Brasil, viajar pelo país. E adoraria ser uma embaixadora de Nabokov para os leitores brasileiros”. 

 

“É por causa da nossa imaginação que não somos sujeitos que olham apenas para o próprio umbigo, mas seres humanos que dialogam com outras imaginações de outros seres humanos através dos tempos”

 

A primeira parte da empreitada é o próprio lançamento de O encantador – Nabokov e a felicidade, livro no meio do caminho entre o ensaio e a ficção. De cara, uma publicação sobre um escritor soa “pouco comercial”. Mas a claridade do texto de Lila envolve o leitor em uma mensagem que foge da rigidez em torno do autor de Lolita e parte para as experiências de encantamento diante da vida e das diferentes noções de felicidade que Nabokov traduz. “Costumamos pensar que o mundo é sempre banal, que a beleza é banal. E ele dizia que devemos ser como crianças olhando para o mundo. Maravilhadas, com uma sensação de gratidão”, resume a escritora. 

Além do deslumbramento, a obra de Nabokov é feita de mulheres fortes. “Elas são incríveis e muito, muito livres. Não é que façam sempre as escolhas certas, mas tomam as rédeas de suas próprias vidas e se sentem livres para amar”, explica Lila. “Especialmente Ada [de Ada ou Ardor: Uma crônica de Família]. Ela é uma mulher com domínio completo da mente e do corpo. É completamente livre, tem uma grande imaginação e paixão pelas artes e pela ciência. Minha heroína favorita.” 

A conversa logo envereda para o poder da literatura. “É por causa da nossa imaginação que não somos sujeitos que olham apenas para o próprio umbigo, mas seres humanos que dialogam com outras imaginações de outros seres humanos através dos tempos.” E quase não nos lembramos de comentar que ela, hoje com 36 anos, filha de iranianos refugiados criada na França, há 12 morando em Nova York, é uma mulher influente nos meios literários americanos, dispensa atenção sobre sua biografia. “Porque meus pais são iranianos, sinto muita pressão nos Estados Unidos para falar sobre a cultura e a identidade do país. É algo que me recuso a fazer. Não acho que a arte tenha a ver com o lugar de onde vim”, argumenta. Mas não custa perguntar: 

Tpm. Você escreve, em O encantador: “Diz a lenda que em literatura devemos alcançar a fantástica centésima página a fim de se entrar no universo de um romance”. Há quem compare a estrutura de um romance à representação da vida social de um homem. Você acha que já chegou a essa página da sua vida?
Lila. Não, acho que ainda não [risos]. Acho que ainda estou bem nas primeiras lições da minha própria narrativa. Então, não. E isso é excitante, assustador, o começo. Realmente sinto que estou na página 25.

E o que espera das próximas 75? Bem, estou escrevendo um romance sobre a busca pela beleza, que é o eixo principal dos meus trabalhos. Continuar perguntando por que a literatura e a beleza importam para nós.

Além de continuar tocando os projetos literários e da vinda à Flip, Lila tem outro compromisso agendado. Bem mais simples, na verdade. Ela quer comer “aquele molho que vocês [brasileiros] põem na feijoada”. 

Molho de pimenta? Não, não é pimenta... Você pode comer com feijoada, é, tipo, cebolas, tomates, pepinos.

Ah... Vinagrete? O quê?

Vinagrete... Vinagrete! Vinagrete! Exato. Sou louca por vinagrete. 

Vai lá: O encantador - Nabokov e a felicidade, editora Alfaguara, R$ 42,90

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