Iluminação indireta para intelectuais

por Redação em

Já repararam que agora ligar o interruptor e acender a luz de sua casa não é mais o suficiente? Sim, os estetas pregam que temos que ter iluminação indireta e ainda falam que isso é difícil. Do outro lado, intelectuais meio de esquerda olham com repulsa para esse capricho. Desvendamos a polêmica. E descobrimos que até intelectual pode aprender a fazer uma luzinha indireta

Houve uma época em que luz de casa era uma coisa simples. Quando éramos crianças, nossas mães tinham um abajur ao lado da cama, uma luminária em cima da mesa... Mas vivemos tempos metrossexuais. Hoje, algumas pessoas, quando mudam para uma casa, contratam “light designers”, os bons e velhos iluminadores, mas com nome mais chique, porque é em inglês, para iluminarem seus mocós.

Agora que iluminar uma casa parou de ser apenas ligar o interruptor, parece que tudo é uma coisa muito complexa. A editora desta coluna, antiesteta convicta para coisas do lar, achava que iluminação indireta era coisa do demo (ou seja, dos estetas). Isso porque ela é meio intelectual, meio de esquerda (termo popularizado por uma crônica do escritor Antonio Prata) e morre de medo de virar uma pessoa do predinho antigo (termo popularizado por uma crônica do escritor Xico Sá) e que tra­ta justamente dos homens que têm uma casa arrumadinha e bem iluminada.

Mas milagres existem. Empolgada com a casa nova, ela foi até a Yamamura (loja de lustres de São Paulo) e conseguiu montar sua própria iluminação indireta em meia hora. E só gastou, no total, 150 reais.

Depois disso, ficou obcecada pelo as­sunto e passou a achar que até meio inte­lectuais podem ter casas com iluminação indireta. Abaixo, uma aula para meio inte­lectuais, meio de esquerda. E uma entrevista com Xico Sá e Antonio Prata para saber como os meio intelectuais lidam com a complexa questão da iluminação indireta.

Como fazer uma iluminação indireta em sua casa

(para os meio intelectuais)

Compre dois abajures de 30 reais e coloque-os em pontos estratégicos de sua casa. Es­colha uma luminária de pé que tenha a haste flexível, o que significa que a luz pode ser mudada para cima ou para baixo, e posicione-a em um canto da sala. Pegue uma antiga luminária com grife, que você comprou em um momento de surto, e a exponha em posição de destaque, tipo numa estante. Acenda todas ao mesmo tempo. E esqueça que você tem luz no teto. Se não conseguir esquecer, faça como um amigo e radicalize. Arranque as luzes para não cair em tentação.

Dois meio intelectuais e a iluminação indireta
Quantos pontos de luz tem na sua casa?

Antonio Prata. Minha casa é meu corpo e, não sei se você sabe, eu sou uma pessoa iluminada. Eu tenho rios de chakras, mas nos chakras a luz é de lampião, porque é mais hippie. Esse pessoal do De Rose Yoga põe luz branca no chakra, mas eu sou contra. De modo que, sobre a sua pergunta, não tenho a menor idéia.

Xico Sá. Além da minha luz própria? Contando com fluorescentes e aquelas lampadinhas econômicas do tempo do apagão de FHC... seis lugares iluminados.

Vocês sabem o que é ponto de luz? Se sim, o que é?

Antonio Prata. Ponto de luz deve ser um ponto de onde sai uma luz, ou seja, um fio com um soquete e uma lâmpada. Você sabe o que é soquete? Não, né? Afinal, direta ou indireta, quem troca as lâmpadas somos nós, homens, né não?

Xico Sá. Onde tem uma lâmpada ou cabe uma acho que é um ponto de luz, não?

Quem fez a iluminação da casa de vocês?

Antonio Prata. Quem faz a iluminação, Nina? Que tipo de pergunta é esta? Até onde sei, a Eletropaulo e as lâmpadas Osram, com a Usina de Itaipu e, quem sabe, até aquela tal Usina Elétrica de Traição ali da marginal. Que nome, né?

Xico Sá. Toda vez que a Rita [Wainer, estilista] vem aqui ela dá um truque, com qualquer abajurzinho velho ou as luminárias que me presenteia. Mas basta ela sair e eu acendo tudo de novo, coisa de educação de pobre, para quem ter uma casa bem acesa era sinal de que estava bem de vida. Luz indireta só quando tenho mulher em casa! Minha solidão odeia luz indireta, é muito sartreano pro meu gosto!

Se foram vocês, que técnica utilizaram?

Antonio Prata. Tem que encaixar a lâmpada no soquete e girar pro lado certo. Mas às vezes aquela porcaria daquela rosca, que é muito fina, rasga. Em última, mas última hipótese mesmo, o negócio é chamar o Jurandir, que é o zelador, e saber que isso não abala a minha masculinidade.

Xico Sá. No dia em que eu dominar a técnica da luz indireta meu pai não me recebe mais lá no Crato com a festa de sempre!

Vocês acham que existe uma repulsa entre quem gosta de ler muito e a tal iluminação indireta?

Antonio Prata. Para mim, iluminação indireta é você receber a bênção do coroinha, não do padre, ou ter sido ungido por algum apóstolo, não pelo filho de Deus em pessoa. Ou então, ainda, conhecer os livros e filmes só de ler as orelhas. No alemão, diz­ se indiretzen-Aufklärung para essa turma de aros grossos e erudição banguela.

Xico Sá. No meu caso é falta de manha mesmo para a coisa. Mas a Rita me convenceu que melhora a leitura, eu chego lá!

Por que as pessoas hoje são contra uma luz no teto? Aquela coisa tão normal que sempre acompanhou nossas casas?

Antonio Prata. Que pessoas, Nina? Você tá falando sério que tá acontecendo isso aí? Aonde você tem ido?

Xico Sá. Do Brás pra frente é tudo ainda luz no teto! Da praça Saens Pena pra frente é tudo luz no teto... A luz indireta só rola no nuestro mundinho fresco e decorado. Em casa de menina acho ótimo, mas em mocó de homem pega mal. Daí pra entender de vinho e sentir o bouquet é um segundo...

Já foram alvo de alguma amiga/namorada/amigo gay que chegou e meteu o pau na iluminação da casa?

Antonio Prata. Nina, se alguém vier falar mal da iluminação da minha casa eu mando reclamar lá na Eletropaulo ou na Osram. E, se não sair da minha casa, eu expulso. Nem que tenha que pedir ajuda ao Jurandir. (Seria, daí, uma expulsão indireta?)

Xico Sá. Ah, a Rita supracitada muda com jeitinho e amor de amigo, ela sempre melhora a minha vida!

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