Faça amor, não faça hora extra
Chega de botar o pau na mesa: as mulheres estão transformando o trabalho
Você não precisa trabalhar que nem homem: para que se conformar com tão pouco?
O modo testosterônico de ganhar o pão de cada dia (e quem sabe um brioche de bônus) é uma invenção da era industrial. Com processos rígidos e hierarquia militar, linhas de montagem e escritórios fabricaram o progresso e o estresse. Assim como o motor a vapor, essa lógica de produção ficou obsoleta.
O filósofo Roman Krznaric, entrevistado na reportagem “Pau na mesa pra quê?”, resume em seu livro Como encontrar o trabalho da sua vida a pandemia de insatisfação nas empresas. “Um estudo em vários países europeus demonstrou que 60% dos trabalhadores escolheriam uma carreira diferente se tivessem a opção de começar de novo”, aponta. “Nos Estados Unidos, a satisfação no trabalho está em seu menor nível – 45% – desde que essas estatísticas começaram a ser compiladas duas décadas atrás.”
E adivinha quem costuma ficar com as piores mesas desse ambiente insalubre? As mulheres. De acordo com o último censo, elas recebem salários 30% menores que os homens com funções equivalentes e ocupam 20% dos cargos de chefia. A desigualdade cresce no tempo dedicado às tarefas domésticas, de acordo com a Organização Internacional do Trabalho: 26,6 horas semanais delas para 10,5 deles.
(Dez horas e meia?! Três para lavar o carro, cinco para preparar o churrasco, duas arrumando os CDs e meia hora para enxaguar a própria escova de dentes após o devido uso. Bom, é só um parêntesis sem base estatística nem valor científico.)
Se você achava que a revolução digital seria capaz de liquidar rapidamente os antigos vícios industriais, as notícias do departamento de RH do Vale do Silício são desanimadoras. Praticamente só tem homem trabalhando por lá – entendeu por que tanto fliperama nas “salas de descompressão”? E algumas das raríssimas mulheres em posição de liderança ainda têm se comportado como homens.
Exemplo? A diretora de operações do Facebook, Sheryl Sandberg, oferece uma explicação torta para a ausência de mulheres no topo dos organogramas: elas, ao contrário dos homens (e dela própria, por supuesto), não colocam suas carreiras como prioridade absoluta de vida. As malucas teimam em perder tempo com filhos, família, amigos, saúde, lazer e outros detalhes desimportantes, e aí adeus promoção.
Só que esse não é o problema. É a solução.
Justamente por se importarem com o que acontece além do expediente, as mulheres podem não apenas ocupar seu espaço nos negócios, mas transformar nossa relação com o trabalho. Transformar o trabalho.
Igualdade profissional é mais uma batalha na guerra corporativa. A luta continua até que o modelo de trabalho masculino, que vem gerando frustração e medo em todos os níveis e departamentos, dê lugar a um outro, mais feminino, acolhedor e flexível.
Faça amor, não faça hora extra.
Fernando Luna, diretor editorial