Estilo pensado
Ted Polhemus, antropólogo americano, explica por que ser único vale mais do que seguir tendências
O antropólogo americano radicado em Londres Ted Polhemus, 65 anos, é um dos maiores estudiosos da moda e de sua tradução para as ruas. É autor de livros como Fashion & anti-fashion (publicado em 1978 e ampliado em 2011) e Streetstyle: from sidewalk to catwalk. Este último, feito em parceria com o museu inglês Victoria & Albert, resultou também em uma exposição de fotos que Ted fez da moda de rua da Inglaterra dos anos 80 e 90. Aqui, ele fala sobre os rumos da moda.
Por que as pessoas sentem necessidade de seguir uma tendência, mesmo que não tenha a ver com o seu estilo?
Sou velho o suficiente para lembrar que, quando comparado a hoje, existia de fato uma ditadura da moda que dizia o que as pessoas deveriam ou não usar. Por exemplo, no começo dos anos 60, lembro que minha mãe, que odiava moda e mais ainda costurar, encurtou suas saias quando decretaram que elas deveriam ser mais curtas. E cores também: quando decretaram que a moda seguinte era o rosa, a maioria das mulheres jogou fora suas roupas antigas e comprou diversos itens rosa. Atualmente, não só vemos muito mais variedades de estilo nas ruas como também muito mais tendências sendo apontadas nos desfiles, ao contrário de uma direção só, como foi quando a Dior lançou o New Look, em 1947. Hoje seria muito difícil identificar uma única tendência para seguir.
Essa necessidade de seguir uma tendência vai acabar?
Pela minha experiência, acho que as pessoas cada vez mais têm orgulho de ter boas peças. Elas até falam “eu tenho isso há anos”. O que quer dizer que as tendências de hoje não são vistas como algo necessariamente melhor, ao contrário do que acontecia há algumas décadas, quando o “novo” era sempre “melhorado”.
“Usamos as roupas para sinalizar o que acreditamos como indivíduos, então compramos marcas que acreditamos que têm a coisa certa’ a dizer”
Como a valorização do estilo pessoal em detrimento às tendências tem afetado o mercado da moda?
Foi na Inglaterra, nos anos 80, que se começou a ouvir o termo “vítima da moda” como algo negativo. Ultimamente, a expressão “na moda” também migrou de algo que todo mundo queria ser para algo que se evita. Podemos debater para sempre o que causou essa mudança, mas acho que o mais importante é apontar que cada vez mais as pessoas querem ser reconhecidas como únicas e criativas, sendo a roupa uma “apresentação” do que são. Isso começou em territórios mais extremos, como os punks e os góticos, mas, no meu ponto de vista, passou da minoria para a maioria. Cada vez mais as pessoas querem se diferenciar umas das outras.
As pessoas estão consumindo roupas de maneira mais consciente?
Não comprar roupas de marcas que usam trabalho escravo é só o começo. Hoje, todas as marcas são “marcas de ideia”, ou seja, representam valores, crenças e sonhos. Uma das primeiras a perceber que esse era o caminho foi a Benetton, nos anos 80, que ficou famosa por suas campanhas com cunho político que nem mostravam as roupas que estavam vendendo. Quando compramos ou usamos um logo, uma marca ou até mesmo um estilo, estamos sinalizando que aqueles também são os nossos valores, crenças e sonhos. Nós usamos as roupas para sinalizar o que acreditamos como indivíduos, então compramos marcas que acreditamos que têm a “coisa certa” a dizer.
Que direção a moda está tomando?
Caminha para algo global e pessoal ao mesmo tempo, peças “misturadas” e sempre com algo a dizer. Antigamente, nossa identidade dependia de circunstâncias como onde você nasceu, a classe social da sua família, sua religião, nacionalidade e cor de pele. Hoje, cada vez mais, nós moldamos e construímos nossa identidade. Com isso vem a necessidade de construir um estilo que simbolize isso tudo. Estilo sempre foi importante na história da humanidade, mas ultimamente é uma questão de escolha pessoal, com uma mensagem única.
Jessica Pauletto veste vestido Walério Araújo