E ela nada
A nadadora Mariana Brochado chorou na frente do Brasil inteiro ao ser eliminada do Pan 2007 e comoveu até o mais alienado dos sedentários. De folga para se recuperar do baque, a atleta com pinta de modelo fala da ferida que não deve cicatrizar tão ce
Quando Mariana Brochado, 22, viu Manuella Lyrio, 18, e mais três atletas atropelarem-na dentro d'água, não entendeu nada. Acelerou as braçadas, mas o corpo, cansado, não respondia com a eficiência necessária. Era a última seletiva para os jogos Pan-americanos 2007 e ela era a favorita. Até o placar marcar 4'15 para Manuella. Mariana terminou em quinto lugar, com inúteis 4'18. Estava eliminada da competição mais aguardada pelos brasileiros neste ano. Pela primeira vez, os jogos serão no Rio de Janeiro, cidade onde Mariana nasceu e treina desde os 4 anos no mesmo clube, o Flamengo.“Vi um trabalho de três anos escorrer pelos meus dedos em quatro minutos”, diz à Tpm, no sofá de seu apartamento na Gávea, enquanto a TV ligada transmite os preparativos para o Pan, que não terá nenhum representante dos clubes cariocas.
Mariana poderia ter engolido o choro, feito cara de desdém, descontado na imprensa, xingado a adversária. Mas, em rede nacional, desmoronou em lágrimas com uma sinceridade rara de se ver. Fãs, amigos, jornalistas e outros atletas lotaram sua caixa com mais de 100 e-mails (aos quais respondeu um a um). No dia seguinte, fotos como a da página do lado saíram nos principais jornais do país e mesmo quem não nunca ouviu falar dela ficou comovido com o episódio.
Balada na piscina
Em 2003, Mariana não só foi para os Jogos Pan-americanos em Santo Domingo como levou medalhas de prata e bronze. Há 18 anos, cai na água diariamente e há seis faz parte da seleção brasileira de natação. Na adolescência, enquanto a maioria dos amigos saía à noite, enchia a cara e acordava na hora do almoço, ela vivia “os melhores anos de sua vida”. Participou da primeira Copa do Mundo aos 13 anos, bateu o primeiro recorde sul-americano aos 17 (atualmente, é recordista sul-americana dos 200 m livre) e foi para as Olimpíadas de Atenas aos 19. Desde novinha, acostumou-se a ter horários definidos para ir à escola, nadar, brincar, dormir, comer. Hoje, ela salta da cama às seis e meia, não importa o clima, a preguiça ou os problemas. Deixa tudo fora da piscina para dar conta dos dois treinos diários, que somam cinco horas e cerca de 13.000 metros de água. À noite, vai para a faculdade de direito. “Não penso em largar o esporte, mas sei que é uma profissão que não dura para sempre”, diz.
Aos 10 anos, pensou em largar a natação, mas foi convencida do contrário pelo pai – engenheiro, que lhe ensinou a fazer virada olímpica na infância – e pela mãe. Marcos Lamah, treinador de Mariana há seis anos, conta que o sorriso constante, que virou sua marca (e que, somado aos belos traços, colabora para sua fama de “musa da natação”), vai embora quando coloca o maiô. “Na piscina, ela é séria. Tem dias em que chega aqui com a cara amarrada. Mas cumpre todo o treino sem fazer corpo mole”, diz o homem que passa mais tempo com a atleta do que com a esposa. Há sete meses, Mariana namora o jogador de vôlei Guilherme. “É ótimo sermos os dois atletas porque entendemos as prioridades um do outro”, diz ela.
O apoio dele foi fundamental depois da derrota, a primeira grande frustração de Mariana em águas nacionais. Por levar uma vida parecida, ele entendeu o impacto do que aconteceu com a namorada, que não contava com a possibilidade de ficar fora do Pan. “Acabei subestimando a adversária, baseada nos outros resultados”, confessa. Foram dias chorando e noites em claro. Vez por outra, pensava em desistir de tudo. Mas a idéia passou rápido, culpa da própria natação e da vida disciplinada. O esporte, apesar de lhe render dores constantes no corpo, a fez forte também emocionalmente. E, mesmo que perca a cabeça de vez em quando, ela sabe para onde voltar.