Dia de glória

Mara Gabrilli recebe homenagem e lembra do dia em que teve sua vida salva por bombeiros

por Mara Gabrilli em

Acordei domingo bem cedo e fui para o Parque da Independência (onde fica o museu do Ipiranga, em São Paulo). Conforme fui me aproximando, viaturas do corpo de bombeiros estacionadas nas ruas ganhavam destaque. Estava indo numa cerimônia de comemoração ao Dia do Bombeiro, que se faz em 2 de julho. Fui convidada a receber o título de Bombeiro Honorário, por indicação do respeitado coronel Jair Paca, que coleciona casos de vidas salvas. Não tinha, até o momento em que cheguei ao evento, consciência do que significava tudo aquilo.

Fui acompanhada até o palco por alguns tenentes que cuidaram de mim com muita atenção e carinho durante toda a cerimônia. Pus-me a observar o comprometimento desses policiais militares que, indubitavelmente, não possuem frouxidão no caráter. Para chegar ali é preciso muito comprometimento e coragem para salvar ou morrer. Alguns exalavam força, outros tinham beleza física de se fazer notar a distância e todos audazes, vigilantes e leais, orgulhosos de ser bombeiros.

Fui escolhida entre homenageados e autoridades para proferir algumas palavras. Na verdade, o escolhido foi o Papa, prefeito de Santos, que generosamente sugeriu que eu falasse. Eu já estava segurando o meu choro desde que o coral da polícia militar dominou ouvidos e corações. Quando, com a voz embargada, comecei a falar, fui pouco a pouco relembrando o meu resgate do acidente que sofri. O carro caiu mais de 15 metros na serra de Taubaté e fiquei presa por duas horas e meia. Vieram motoristas e policiais, e eu não permiti que me tirassem do carro. Zelei por mim até o resgate chegar. Nada neste mundo me deu maior acalento do que a voz daquele bombeiro dizendo: "Fique tranquila, vamos tirá-la daqui. Imobilizaremos sua coluna e serraremos o carro".

Obrigada

Naquele momento, estava pronta para desmaiar e me deixar para eles cuidarem. Minha mãe disse que, no dia seguinte, o bombeiro voltou ao hospital de Taubaté para contar que quando chegou ao local do acidente eu estava consciente. Imagine a diferença que essa informação produziu na cabeça dos meus familiares, já que semanas de inconsciência sucederam o acontecimento. Que integridade! Ele ainda deu outros detalhes, inclusive da conversa dele com o médico.

O que mais estava me emocionando na comemoração era a possibilidade de agradecer o fato de eu estar ali naquele momento, pois isso só foi possível porque um dia fui salva por bombeiros.

Disse que aquele específico que me salvou, soube que morreu, mas deixou em mim o espírito cumpridor do dever que leva, traz e dá momentos de paz, como diz a própria canção do corpo de bombeiros. Cantamos como se fosse uma oração de fé aos que salvam, aos que morrem e aos sobreviventes como eu.

Me fez refletir sobre o que fiz da segunda vida que ganhei...

Mara Gabrilli, 42 anos, é publicitária, psicóloga e vereadora por São Paulo. Fundou a ONG Projeto Próximo Passo (PPP), é tetraplégica e foi Trip Girl na Trip #82. Seu e-mail: maragabrilli@camara.sp.gov.br

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