Cantada X Agressão

Buenos Aires adere a projeto mundial que trata a linha tênue entre cantada e agressão verbal

por Ana Manfrinatto em

Faz tempo que eu tenho vontade de dizer que é soda limonada aguentar o assédio masculino pelas ruas de Buenos Aires. Sabe quando você passa na frente de uma obra e ouve o que quer e o que não quer? Então, aqui isso acontece em cada quadra esteja você de minissaia e decotão ou então com um casaco + capuz + cachecol durante o inverno.

Os piropos (cantada, em argentinês) e/ou as agressões são de homens de qualquer idade e classe social. Você tá andando na rua e de repente o cara manda uma frase tipo “te cojo toda mamita” ou “te chupo las tetas” (nem precisa traduzir, né?) e sai andando. CALMA, PAI, pode ficar sossegado: porque eles simplesmente falam e continuam andando como se nada tivesse acontecido, é como se fosse por esporte.

Digo que é como se fosse por esporte porque, pelo menos na bomsensolândia, se o cara tá REALMENTE a fim de você, ele não vai se aproximar e dizer uma expressão chula, correto? Ou seja: parece que eles fazem isso inconscientemente, como se fosse um lapso de toda a cultura machista que eles levam nas costas e que, em uma frase, se manifesta de forma gratuita.

É claro que tem cantada bonitinha também… uma versão argentina do “seu cachorrinho tem telefone?” seria: “olha, você deixou cair!”/ “o quê?”/ “o papelzinho do bombom”. É que um bombóm é uma menina ou um menino muito bonitos. Enfim, pra dizer que tem cantadas e cantadas assim como tem pessoas e pessoas… O que não é ofensa pra alguém pode, sim, ser ofensa para outra.

Tudo isso para dizer que, há poucas semanas, Buenos Aires aderiu à iniciativa de María Tidball-Binz, uma curadora de 29 anos que vive no bairro portenho de San Telmo e coordena o site http://buenosaires.ihollaback.org, um espaço que convida mulheres a contarem experiências de cantadas que não foram bem vindas e que também propõe uma reação ao que María define como sendo uma “outra forma de violência de gênero”.

A versão portenha é parte do projeto http://ihollaback.org, que conecta diversas cidades ao redor do mundo. Além dos piropos, o site também procura combater os comentários e atitudes discriminatórias feitos na rua contra pessoas trans e casais do mesmo sexo. A entrevista completa com María, publicada no jornal argentino Página/12 pode ser lida aqui.

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