Binki no clube do Bolinha

Conheça Binki Shapiro, a menina do trio Little Joy

por Carla Campos em

Ela canta ao lado de dois grandes músicos, viaja o mundo fazendo shows de rock, namora um ídolo internacional. E tudo aconteceu por acaso na vida de Binki Shapiro, a menina do trio Little Joy.

Com o cabelo cuidadosamente desarrumado e a cara lavada – exceto pelo uso de delineador e rímel, dupla que compõe um estilo retrô –, Binki Shapiro aparece. Vestida com um shortinho hipercurto, uma malha de manga comprida e decote generoso, a integrante mais desconhecida do Little Joy – projeto musical idealizado por Rodrigo Amarante, do Los Hermanos, e Fabrizio Moretti, da banda americana The Strokes – parece ter alcançado, aos 23 anos, o sonho de muitas fãs de rock. Ela faz parte de uma banda bem-sucedida, divide o palco com dois grandes músicos, viaja pelo mundo se apresentando para centenas de pessoas e, ainda, apaixonou-se por um rock star – e foi correspondida.

A pele superbranca de Binki faz duvidar que ela tenha nascido e crescido na ensolarada Los Angeles, na Califórnia. Mas foi lá, há pouco menos de dois anos, que a cantora conheceu os atuais companheiros de banda. E Fabrizio acabou tornando-se mais que amigo. Binki e ele, que é baterista de uma das maiores bandas de rock da última década, namoram há pouco mais de um ano. “O Fabrizio é um artista incrível. Muitas pessoas não sabem desse seu lado e ele odeia que eu fale, mas ele já teve seus desenhos publicados pelo The New York Times, e eles são realmente incríveis!”

Numa entrevista exclusiva ao site da Tpm, Binki falou sobre a nova carreira, a vida em uma van, seu rolê pelo mundo como babá e, claro, sobre seu amor.

Como vocês três se conheceram?
Eu conheci o Fab através de um amigo em comum, quando ele se mudou para Los Angeles. Lá, há um círculo muito fechado de pessoas, parece que todo mundo conhece todo mundo. Nos gostamos instantaneamente e nos meses seguintes saímos todas as noites, “abalando a cidade”. Nunca me diverti tanto na vida. Logo depois conheci o Rodrigo, através do Fab. Daí nós formamos um círculo, meio que um bando.

E logo em seguida formaram a banda?
Não foi bem assim... O Rodrigo estava em Los Angeles para gravar com o Devendra [Banhart, músico folk que faz parte do tal círculo fechado]. Nós ainda não nos conhecíamos bem nessa época, mas em algum momento o Rodrigo e eu começamos a falar de música e acabei aparecendo na casa do Devendra. Nesse dia eles estavam gravando “Shabop Shalom”, que é uma música muito engraçada, e Rodrigo e eu ficamos acordados até as oito da manhã trabalhando numa música – que acabou não entrando no álbum. Quando o Rodrigo foi embora, Fab e eu começamos a discutir ideias de músicas. Acabamos gravando “Play the Part”, que está no nosso álbum, e a enviamos para o Brasil. O Rodrigo gravou a guitarra e alguns vocais e a enviou de volta. Daí o Fab e eu gravamos a segunda voz. Logo depois o Fabrizio convidou o Rodrigo para voltar a Los Angeles e trabalhar mais naquela música. Ele foi com a intenção de ficar por duas semanas, mas acabou ficando um ano ou algo assim... Uma música acabou se transformando em outra e por aí foi…

Houve um momento em que vocês pensaram “nós somos uma banda”?
Estávamos gostando da direção das coisas e pensamos: “Já que o Rodrigo está aqui, vamos gravá-las de verdade”. Porque até então nós estávamos usando o Garage Band [software para músicos amadores]. O Daniel [Jobim, neto de Tom], que estava em Los Angeles tocando com Caetano, foi até a casa do Fabrizio um dia e ficou horrorizado com aquilo! Tipo: “Não, não, vocês não podem usar isso”. E acabou dando uma aulinha básica de como usar ferramentas mais pro. Daí a gente pensou que era melhor pegar um estúdio por um mês e pronto. Acabamos alugando o estúdio por dois meses e convidamos o Noah [Georgeson, produtor do último álbum de Devendra Banhart] para produzir o disco.

E o que você fazia antes do Little Joy?
Até então eu trabalhava sozinha, com minha guitarra e meu computador. Fazia um bico aqui, outro ali, para ganhar dinheiro suficiente para viajar e fazer as coisas que queria. Eu fazia o que precisava para sobreviver sem precisar trabalhar “de verdade”. Não fui uma criança que cresceu querendo ser artista – eu amo música, mas não cresci querendo fazer isso –, e foi ótimo descobrir meu propósito.

Então você nunca sonhou ser uma rock star?
Na verdade nunca tive planos de ser artista. Sei que soa louco e que é o tipo de coisa que as pessoas dizem, mas é verdade... Quando comecei a tocar, descobri que era isso que eu realmente gostava. Foi a primeira coisa que fiz sozinha que gostei. Eu adoro viajar. Sou inquieta e não gosto de ficar num mesmo lugar... Saí da escola aos 15 anos. Tinha um amigo que era ator e que tinha uma esposa e uma filha de 8 meses. Eles viajavam para a Itália e para outros lugares para filmar e eu os acompanhava como babá. Eu fui viajando junto e visitando todos esses lugares... Visitávamos museus, íamos à praia e fazíamos muitas coisas divertidas.

Você dava trabalho na escola?
Não. Eu com certeza me metia em encrencas, mas não as causava. Eu sempre tive uma ansiedade muito grande para fazer outras coisas e estar em outros lugares. Não queria fazer o que mandavam. Não era rebeldia, nunca respondi: “Você que se foda, eu vou fazer o que eu quero”. Mas eu sentia isso muito forte dentro de mim. Quando surgiu a oportunidade de viajar, minha mãe pensou: “Ela pode ir para a Itália e para Paris, viajar sozinha nessa idade… ou ela pode ficar na escola". Eu acho que ela viu o quão empolgada eu estava para fazer aquilo e acabou deixando – ela me libertou.

E quais são seus lugares preferidos?
Eu amo a Costa Amalfitana, na Itália, e Paris. Ainda não passei tempo suficiente no Brasil, mas sinto que tem algum lugar escondido aqui que poderia rapidamente tornar-se um dos meus lugares preferidos no mundo.

Quais foram suas impressões sobre os show no Brasil?
Por causa do sucesso do Rodrigo e da empolgação do público, tocar no Brasil foi uma experiência completamente diferente. É emocionante escutar as pessoas cantando junto comigo porque, de certa forma, elas estão me recebendo, me abraçando… Eu sou muito grata por isso. Dá pra sentir que as pessoas aqui vão ao show pra se divertir e não pra julgar quem está no palco.

Qual foi seu show preferido no Brasil?
Meu show preferido da turnê foi o de Porto Alegre, nosso primeiro no Brasil. Foi nossa primeira vez tocando aqui. Estava quente, nós suávamos e estávamos nervosos. Não esperávamos que as pessoas fossem reagir do jeito que reagiram. Foi a primeira vez que isso aconteceu. Nós realmente “sentimos” o impacto de estar aqui. Foi incrível. O Rodrigo estava tão emocionado que chegou a lacrimejar no palco. Ele vai me matar por dizer isso.

O Little Joy foi muito bem recebido, tanto pelos críticos como pelos fãs. O que você acha disso?
É incrível. Nós nos perdemos na casa do Fabrizio e no estúdio e chegou uma hora que já não sabíamos o que estávamos fazendo. A gente se perguntava: “Isso é uma merda?! Alguém vai gostar disso?!”. Perdemos a perspectiva porque os vocais começaram a ficar estranhos e os instrumentos que estávamos usando eram pouco convencionais. Mas o mais assustador é fazer as letras. Na maioria das vezes, as pessoas procuram criticar o que os outros dizem. Nós três escrevemos nesse álbum. O Fab e eu estávamos com muito medo. O Rodrigo menos. Ele escreve há algum tempo e acho que já sabia como seria recebido… É meio que como mostrar a alguém seu diário. Sempre ficava a dúvida se havíamos dito o que queríamos dizer, o quão bem poderíamos tê-lo dito.
 
[Binki para. Respira fundo e pergunta] Qual foi a pergunta mesmo? Eu tô falando sem parar…

Lembro-me do primeiro dia em que postamos as primeiras músicas no MySpace. O Fab e eu estávamos lá, esperando. Uns cinco minutos depois checamos o perfil esperando que uma ou duas pessoas tivessem escutado as músicas. Para nossa surpresa, elas já haviam sido escutadas mais de 50 vezes! Alguém comentou algo do gênero: “Puta merda! Isso é demais, eu não tinha ideia de que seria tão bom!”. E a gente respondeu na hora, superempolgados: "Muito obrigada! Nós te amamos! Você é incrível! Não tem ideia de como isso é importante para nós!”.

Como é ser a única mulher na banda? Você tem algum privilégio?
Eu nunca pensei sobre isso. Como nós começamos como amigos, nunca achei que tivesse que lutar por espaço. Eu não tenho nenhum privilégio. Até tentei, no começo: “Vocês podem carregar o equipamento e montar tudo”, mas eles me cortaram rapidinho. Nós carregamos e guardamos tudo. É como um time. A única folga que tive foi quando estávamos no Reino Unido e o ônibus da turnê tinha uma cama a mais. Pedi, encarecidamente, se poderia usar a beliche extra para deixar a minha mala – eles deixaram. Mas, na verdade, nunca me senti como a única menina. Alguns dos meninos são bem mais sensíveis do que eu! Eles são muito doces e gentis, não é como se estivesse com um monte de maloqueiro.

Mas não tem nada que te irrite ou vice-versa?
Meu cabelo fica meio selvagem às vezes – especialmente no calor. Aí eu preciso domá-lo, seja com um secador, seja com um ferro – e isso leva um tempo. Isso os irrita um pouco sim. Mas é a única frescurinha que eu tenho. Eu sinto que me tornei mais moleca andando com eles.

Vocês passaram alguns meses sozinhos, numa van. Como isso afetou seu relacionamento com o Fabrizio?

Eu tive que ficar sozinha no quarto de hotel algumas vezes! Não é natural para o ser humano cobrar tanto um do outro. Não acho que as pessoas consigam viver assim. Nós três somos muito independentes e temos personalidades fortes. Do jeito que está agora – por exemplo, podendo sair sozinha e fazer minhas coisas e depois os encontrando para jantar, tocar e sair para beber – funciona.

Você tem um estilo retrô, meio anos 60. O que estava escutando na época da criação do álbum?
O iPod estava cheio de Wailers, Bob Marley em começo de carreira… Essa banda chamada The Fleetwoods – eu não sei de quando eles são, talvez dos anos 40 ou 50. Mas esse cara, Gary Troxel, tem a voz mais arrasadora do mundo. Eles têm uma música… É o tipo de música que te faz chorar em um segundo. A voz dele tem aquela tipo de magia, sabe? Como Elvis. Escutava também muito Nina Simone e o último álbum do Devendra, Smokey Rolls Down Thunder Canyon.

O que você gosta de fazer quando não está tocando?
Eu comecei a desenhar recentemente – mas não sou muito boa. Mas o Fabrizio é um artista incrível! Muitas pessoas não sabem desse seu lado e ele odeia que eu fale, mas ele já teve seus desenhos publicados pelo The New York Times! Ele meio que me inspirou a começar a desenhar... Eu aproveito o talento dele para aprender.

Binki brinca com seu colar dourado, em que se pode ler o nome Cheney. Sua pele é tão clara que ele quase desaparece no seu colo.

Quem é Cheney?
Minha irmã e confidente. O Rodrigo morou um tempo com ela em Los Angeles e, quando nós íamos ensaiar em sua casa, ela era tipo a mãe de todos. Ela é mais velha e mais responsável e sensata do que eu. [A cantora continua brincando com o colar] Ela chorou muito o dia em que fomos embora – não por mim – ela sabia que eu voltaria, mas porque ela sabia que o Rodrigo ficaria no Rio e o Fab em Nova York.



[Fabrizio começa a rondar a mesa, à espera de um sinal para se aproximar.]

Falando nisso, como ficará o Little Joy agora que os Strokes vão começar a ensaiar?
Vai ser bom voltar para casa para relaxar um pouco – mesmo que apenas por algumas semanas. Desde que começamos a gravar não paramos um minuto. A responsabilidade é grande para aperfeiçoar as apresentações ao vivo e dar entrevistas. Mas, principalmente, para produzir o máximo possível no tempo que temos. O futuro do Fabrizio é incerto em relação à disponibilidade de tempo. Como não sabemos o que acontecerá depois da turnê, tentamos fazer o máximo possível quado estamos juntos. O Rodrigo e eu estamos muito a fim de tocar em festivais de música no próximo verão. A ideia é roubar o Fab nos fins de semana!

[Fabrizio se aproxima e rouba um beijo da namorada. Ela sorri timidamente e o apresenta. Em seguida, diz que ele pode ir embora pois “está tudo bem”. Ele senta no bar ao lado de nossa mesa. Perto o bastante para que sentíssemos o cheiro de seu cigarro, mas longe o suficiente para não escutar as respostas de Binki.]

Mas diz uma coisa, não tem nenhuma partezinha de você que gostaria que o Strokes não voltassem?
Não! Eu amo os Strokes. Mal posso esperar para ver o que eles vão fazer agora. Eu acho que eles ficaram bastante tempo separados para realmente focar nesse próximo álbum. Nick [guitarrista dos Strokes] é um grande amigo nosso e nos apoiou muito nesse projeto. Nos ajudou muito e deu muito amor – ele é incrível. Ele nos mostrou no que está trabalhando para o novo projeto dos Strokes e é incrível. Eu nem consigo imaginar o que acontecerá quando o Fab fizer sua contribuição e o Julian começar a cantar – qualquer coisa que o Julian canta fica mágico. Ele tem uma voz muito sexy e cheia de vida. Eu sou uma grande fã dos Strokes e ficaria muito triste não só se eles não voltassem, mais se nós fôssemos o motivo.

Mas então o Little Joy é um grupo de um álbum só?

Já estamos trabalhando em novas músicas, tentando aproveitar o tempo que temos juntos. Ainda não há planos para um segundo álbum, mas seria muito bom continuar trabalhando com eles. Eu estou trabalhando numa música, Rodrigo em outra e o Fab em outras duas. Mas a verdade é que ainda não tivemos tempo para sentar e trabalhar juntos como aconteceu com o primeiro álbum. Basicamente, estamos usando todo o tempo do soundcheck para tocar as novas músicas. Mas nós queremos continuar. Eu visitarei o Fab em Nova York e talvez o Rodrigo também.

[Fabrizio chega de mansinho: “Eu estou com fome. Você está com fome?”. “Sim, estou.”]

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