A madrasta jovem é a nova sogra

Antonia Pellegrino: Brigas do pai com a filha são provas de afeto que esse tipo de madrasta deseja

por Antonia Pellegrino em

 

Se a sua nova madrasta regula idade com você, atenção: a fantasia ciumenta, que normalmente é voltada para as ex-mulheres ou mulheres quaisquer, pode ser investida contra você. Soa patético, já que a mulher que disputa lugar com a filha de seu namorado revela estar pleiteando o lugar de filha, não de namorada; mas acredite: acontece nas melhores famílias.

Assim como surtos de ciúme podem ser lidos como provas de amor, as brigas do pai com a filha são provas de afeto que esse tipo de madrasta deseja. Vê-los afastados é o que a fará sentir-se amada, segura, protegida. Vê-los próximos, em situações em que haja demonstração de carinho do pai com a filha, torna-se agressão pessoal contra a madrasta, que suplica ao namorado que faça uma escolha: ou eles ou eu. Com medo de perder a nova namorada, o pai tenta administrar a inadministrável situação; e começa a tratar a família, na frente da nova namorada, como um bando de clandestinos. E, no tempo, passa a ser, ele mesmo, um clandestino na vida dos filhos.

Lado a lado

Em uma situação como essa, a independência financeira é o melhor trunfo da filha, que pode apertar o botão do foda-se e reduzir ao mínimo os encontros com a jovem madrasta. Nesses, quando inevitáveis, disfarce o desprezo com um belo sorriso e até se esforce para concordar com alguma asneira que ela diga. Assim, os danos à sua vida prática serão poucos, embora, na dimensão simbólica, os prejuízos possam ser irreparáveis, pois fica difícil admirar e, no limite, amar um pai que permite à namorada atentar contra seus filhos.

Mas se você for jovem, linda e adorável e ainda viver entre a casa do pai e a da mãe, e portanto tiver que conviver com a madrasta, comece a poupança desde já, pois prevejo um longo futuro ao lado de seu analista. É impossível não sentir que a atitude do pai é uma tremenda rejeição a você. Se você não for masoquista, é quase impossível não passar a, naturalmente, rejeitá-lo também. E aí é o começo de um filme que muita gente já viu: pai e filha se afastam, cheios de mágoas, os anos vão passando, e, se não houver um evento forte o suficiente para refazer a saúde da relação, passa-se a vida sem o privilégio de viver feliz em família.

Mas a madrasta estará alegre, seu namorado foi capaz de lhe dar as provas de que ela precisava para sentir-se segura, amada, protegida. Finalmente serão só os dois, livres do passado, prontos para viver seu amor, cercados por fantasmas.


Antonia Pellegrino, 31 anos, é roteirista e escritora. Seu e-mail: a.pellegrino@terra.com.br

Arquivado em: Tpm / Comportamento