É um parto
Mês das mães, e eu às vésperas de entrar pro clube. Quando vou conseguir desacelerar?
Os imperativos do mundo – trabalhe, compita, realize, ganhe, tenha – não poderiam ser mais opostos aos sentimentos da gravidez – sinta, doe, cuide, demande, ame, dê –, mas são aqueles e não estes que tendem a nortear os nove meses de gestação, masculinizando um dos períodos mais femininos da vida de uma mulher. Um dos poucos, talvez dos últimos, bastiões da feminilidade.
Foi-se o tempo em que ficávamos como na ilustração de capa do melhor dos livros sobre gravidez que li, O que esperar quando você está esperando, em que aparece uma senhora prenha sentada numa cadeira de balanço. Realmente “esperando a chegada do filho”. Atitude que, graças aos tempos, se perdeu, para nossa sorte, mas deu lugar a outra, à das supermães-máquina, que levam a gravidez como se nada estivesse acontecendo.
Simplesmente porque não podem levar de outra maneira. Têm responsabilidades previamente assumidas, muitas têm obra pra tocar em casa, têm financiamento para continuar pagando que, somado ao custo gravidez, parto e pós-parto, torna difícil não se ver como “nova pobre”. Sobretudo se você não tem o benefício da licença-maternidade. Aí, é trabalho além da conta, como as formiguinhas da fábula infantil.
Desta à dimensão prática nascem os conflitos subjetivos entre o mulherão que nós aprendemos a ser desde que fomos liberadas por nossas avós e a mocita que nós não sabemos como ser, mas somos, querendo ou não, durante a gravidez. Uma mocita que não sabe onde pôr as mãos, no corpo de uma mulher descolada. Ninguém, nem você nem o mundo, está preparado pra isso.
Reta final
No segundo trimestre, o momento de ouro da gravidez, os conflitos ficam diluídos pela força de leoa que a gravidez nos dá. Uma força realizadora, impetuosa e feminina que nos impele a construir o melhor ninho possível. Mas que chega ao terceiro trimestre, o momento banheirão, bastante enfraquecida pelo peso, pela dificuldade de dormir, lentidão, distração, insegurança, fragilidade. Mas a vida não dá trégua: o mundo segue cobrando que você aja como se tudo continuasse normal.
Vontade de sumir, ficar quieta. Não de férias, porque férias é alegre. Vontade de silêncio e melancolia. De chá quente e literatura. De chorar. Não de tristeza, mas da delicadeza de um olhar amoroso.
E dá tempo? A agenda com os últimos afazeres antes do parto é longa. E a pior constatação de todas é que sou tão acostumada a vencer dias com agendas quilométricas que desaprendi o silêncio, a verdadeira paz de espírito, sem ansiedade ou ar preso no peito.
Pra casos como o meu, só o Frontal ou o foda-se.
Antonia Pellegrino, 32 anos, é roteirista e escritora. Seu e-mail: a.pellegrino@terra.com.br