No Capão Redondo, periferia de São Paulo, ela encontrou na corrida a força para transformar a sua vida e de milhares de crianças e mulheres através do esporte
Marineide Santos Silva deixou a Bahia aos seis anos com a promessa de uma vida melhor, mas o que encontrou em São Paulo foram abusos, trabalho doméstico e exploração
Aos 14 anos, ela viu seu destino mudar. Uma das meninas do revezamento da prova de atletismo havia faltado na escola e o professor de educação física escolheu Neide para substituí-la
“Coloca a Neide porque ela é fininha. Qualquer coisa, o vento leva”, disse ele. E levou. Ela não só ajudou a equipe a conquistar uma medalha como encontrou na corrida sua verdadeira vocação
O Capão Redondo, na zona sul de São Paulo, foi o bairro que a acolheu. Ali Neide viveu suas maiores dores, mas também foi na comunidade que encontrou forças para se reerguer
Em 1979, perdeu seu primeiro marido, morto por um policial. Em 2000, Mark, seu filho primogênito, foi assassinado aos 19 anos em um crime que nunca foi esclarecido
A depressão bateu forte, mas, depois de as vizinhas implorarem pela volta dos treinos que ela ministrava informalmente, Neide se levantou e correu outra vez
Foto: arquivo pessoal/ divulgação
Para honrar a memória do filho, resolveu unir o esporte à aptidão já consolidada como líder local, dessas que conserta tudo, organiza festa junina e ensina artesanato para as crianças
E assim o projeto Vida Corrida foi tomando forma, ganhando novos contornos e atendendo mais e mais pessoas que encontravam em Neide um alento
“Não existia a cultura do esporte, os homens só queriam saber de futebol. E, enquanto eles jogavam, as mulheres ficavam cuidando da casa”, conta
Até 2009, quase uma década após o nascimento do projeto, Neide carregava o Vida Corrida nas costas, angariando dinheiro com rifas, doações e do trabalho como costureira
Foi ao receber de um prêmio o primeiro aporte financeiro que ela percebeu a necessidade de dar mais visibilidade para sua iniciativa
“Eu não era apenas a maluquinha que corria, como me chamavam. Estava fazendo políticas públicas”, conta Neide, que passou a ser chamada para contar sua história em empresas
Foto: arquivo pessoal/ divulgação
Aos poucos, ela foi alcançando sonhos cada vez maiores. Conseguiu apoio financeiro para seu projeto e, em 2016, conduziu a tocha olímpica e viu um de seus atletas competindo nos Jogos Paralímpicos
Foto: arquivo pessoal/ divulgação
Graças à sua luta incansável, a via Arroio do Engenho, no Capão Redondo, ganhou pista de atletismo, cesta de basquete, quadra de futebol e amarelinha
Mais de 4 mil crianças da comunidade já foram impactadas pelo projeto. Muito além dos números, o trabalho de Neide promove a mudança da realidade por meio do esporte
Foto: arquivo pessoal/ divulgação
“Acredito que posso fazer diferença na vida de alguém”, diz ela, que foi escolhida pelo público para ser homenageada no prêmio Trip Transformadores 20/21
“Não posso mudar o mundo, mas posso mudar a realidade do entorno. Já pensou se todo lugar tivesse uma Neide?”
Gente que acredita que só vai ficar bom de verdade quando estiver bom para todo mundo