Há mais de 50 anos as mulheres
tomam anticoncepcional e, mesmo
com os avanços da medicina,
ainda parecemos distantes de
uma versão masculina do
medicamento. Por quê?

Por: Madson de Moraes
Ilustrações: Mariane Ayrosa

E a pílula
masculina,
cadê?

O anticoncepcional feminino
foi lançado ainda nos anos
60, mas as opções masculinas
permanecem, mais de meio
século depois, praticamente
as mesmas. E há muitos
motivos por trás disso

Dinheiro baliza as decisões de
todas as indústrias. Desenvolver
novos medicamentos custa caro e, no
caso de uma pílula anticoncepcional
masculina, as farmacêuticas julgam
o mercado insuficiente

Ainda que as empresas digam
que não acreditam que os
homens optariam pela pílula,
levantamentos recentes
têm indicado o contrário

Quando uma pesquisa alemã,
por exemplo, entrevistou 9
mil homens de vários países,
mais da metade respondeu
que toparia tomar um anticoncepcional

“A literatura médica aponta
para esse fato: os homens
gostariam de poder ter
uma maior participação nas
decisões contraceptivas”,
diz o professor Erick
José Ramo da Silva,
que estuda o assunto

Alguns cientistas questionam
se a hierarquia patriarcal
das farmacêuticas não é uma
barreira. Se fossem dirigidas
por mulheres, uma pílula ou
nova contracepção masculina
já existiria? 

O Dr. Herjan Coelingh Bennink,
professor de ginecologia que
ajudou a desenvolver alguns
contraceptivos femininos
na empresa americana
Organon, onde ficou até
2000, acredita que sim

“Encontrei resistência
dentro do conselho da
empresa, onde a reação
padrão dos membros,
brancos de meia idade,
era: ‘Eu nunca iria usar’.
era considerado algo
para covardes e homens
fracos”, conta

Outra questão levantada é
a biológica: pesquisadores
garantem que bloquear um
óvulo por mês em mulheres é
um desafio mais simples do
que inibir a produção diária
de milhões de espermatozóides

Como bloquear a fertilidade
do homem sem prejudicá-la?
Responder isso, garantem,
é difícil e caro. Com o
desinteresse da indústria
farmacêutica, cientistas
têm buscado alternativas
por meios não hormonais

“Muitas pesquisas já
se mostraram efetivas
em laboratório e são
potencialmente viáveis”,
diz Erick. “Possivelmente,
é por algum método não
hormonal que a pílula
masculina vai chegar
ao mercado”

Dividir a responsabilidade
de planejar e prevenir a
gravidez, que ainda é atribuída
principalmente às mulheres,
é uma reivindicação feminina

“As feministas têm
pedido e exigido isso
para uma possível
igualdade de gênero”,
diz a socióloga alemã
Miriam Klemm, pesquisadora
da Universidade da Califórnia, em Berkeley

“Há inúmeras mulheres
que sofrem muito com os
efeitos colaterais causados
pela pílula feminina”,
explica Lola Aronovich,
feminista, professora
e autora do blog
Escreva Lola Escreva

“Se os homens tivessem
a responsabilidade de
tomá-la, isso aliviaria
bastante o peso dessas
mulheres”, ela reflete,
embora acredite que
isso funcionaria mais
efetivamente entre
casais mais estáveis

“Será que uma mulher
que conhece um homem há
pouco tempo deixaria de
usar algum outro método
anticoncepcional se ele
dissesse que toma a
pílula? Seria arriscado”

Outro golpe poderia atingir as
desculpas sexistas que homens usam
para não assumirem plenamente a
responsabilidade na contracepção

“O que pode mudar é
essa coisa do ‘ah,
eu não queria, foi ela
quem engravidou e decidiu
ter’. Ou ‘ela me deu
o golpe da barriga’”,
diz a antropóloga
Mirian Goldenberg

“Como a responsabilidade
sobre ter ou não filhos
é da mulher, é ela quem
paga todo o preço.
O homem não quer pagar
preço nenhum”, completa

Conteúdo que transforma