Fotógrafo e entregador, o carioca produz um registro histórico sobre a pandemia
Texto: nathalia zaccaro FOTOS: ALLAN WEBER
allan weber:
com a tropa na pista
Quando a pandemia começou Allan Weber perdeu o emprego e teve seu primeiro filho
Carioca da comunidade Cinco Boca, na periferia do Rio de Janeiro, ele se ligou que ia precisar trampar como entregador para segurar a onda da família
“No começo da pandemia foi mó doidera, ninguém sabia o que estava acontecendo e não tinha ninguém na rua, só os motoboys. A demanda por lanche triplicou”, conta
“Quando eu ia pegar lanche os estacionamentos subterrâneos dos shoppings estavam sempre aglomerados de motoboys, com carrinhos e pilhas de lanches”
“E era uma parada que ninguém tinha noção do que estava acontecendo. Só quem tava lá viu. Deixar os lanches nos apartamentos também era doido, me chamava muito a atenção”
“Entendi que aquilo ali precisava ser registrado, todos os motoboys estavam passando por aquelas situações e aí comecei a levar minha câmera pro trabalho”
Com sua point and shoot analógica, que usava pra clicar os rolés de futebol, skate e pipa com os amigos, ele passou a registrar os parceiros de trampo, as mochilas, as bikes, os clientes, a cena toda
Allan já frequentava galerias do Rio e se interessava pelo universo da arte. No fim do ano passado, publicou de forma independente um fotolivro batizado de Existe uma vida inteira que tu não conhece
“Significou muito pra mim, foi muito importante. São registros não só do trabalho, mas de tudo que gosto de fazer”
“Você não sabe o que o rapaz que entrega seu lanche passa, do que ele gosta. E através dessas imagens eu tento falar um pouco sobre isso, existe uma vida inteirA que tu não conhece”
“E pra rapaziada no meU Bairro também. Um amigo me falou que não sabia que existia livro só de foto. Faz muita falta o acesso a esse tipo de conteúdo”
Em maio de 2021, Allan foi escolhido para estampar a capa da ZUM, revista do Instituto Moreira Salles e uma das mais prestigiadas publicações de fotografia do país
“A arte é uma ferramenta de melhoria pro mundo. Onde eu moro a presença do tráfico é muito intensa, então muito menor que não tem acesso a nada cai nessa armadilha”
“Acho importante a arte e a cultura chegarem nesses lugares pra falar a língua deles. Eu tô chamando os menor pra trabalhar comigo e vendo como eles estão amarradões”
“No linguajar dos cria se fala em ‘endolar droga’, que é o mesmo que embalar. Então eu aluguei um lugar lá na favela pra endolar meus livros. Um espaço onde eu quero fazer uma galeria futuramente”
“Uma rapaziada envolvida com crime chegou me perguntando como que faz pra vir trabalhar comigo endolando livro e câmera. Então olha o poder que essa parada tem”
“Vejo muito potencial dentro da comunidade que não é explorado. Quero continuar meu trabalho, abrir a galeria, estar com minha tropa na pista levando meu conhecimento pra rapaziada que precisa”