Você é ou não é
Duran: "Se você faz perguntas e não presta atenção nas respostas, então você é"
Se você faz perguntas e não presta atenção nas respostas ou se fala ao celular como se os outros tivessem que saber de seus problemas, então você é...
Se você é um dos que furam a fila, qualquer fila por qualquer motivo; falam com a boca cheia de comida; apoiam os pés no encosto da poltrona da frente no cinema, mesmo que vazia, e comentam o filme com o vizinho(a) no cinema em voz alta; tentam monopolizar a conversa em uma roda de amigos e, ainda por cima, falam apenas de si mesmo. Fica mudo depois de receber um presente, uma gentileza, mesmo que seja um copo de água em um dia de muito calor e esquece de pronunciar “obrigado(a)” ou “muito obrigado(a)”, palavras mágicas que abraçam corações. Se você não deixa escapar de seus lábios essas mesmas palavras quando alguém cede o passo ao entrar no elevador ou ao cruzar alguma porta.
Se passa perfume pelo corpo em quantidades suficientes para fazer explodir as narinas de qualquer ser vivente que se atreva a circular a poucos metros de distância de seu corpo perigosamente embalsamado. Se na hora de telefonar para alguém dispara o “Quem fala?” antes de se apresentar (1) e pergunta pela pessoa procurada. Se você não olha para os olhos da pessoa com quem está conversando. Fura o farol vermelho ou estaciona em algum lugar proibido (2), arremessa qualquer coisa pela janela do carro (nem menciono da janela do prédio porque isso já é demais), mesmo que seja a ponta do cigarro, na rua (se ele estiver acesso e for na estrada, nem se fala então). Se você, por acaso, é o dono daquele cachorro que fica latindo a noite inteira.
Ou se você decidiu que pode mijar na rua, colocar os cotovelos na mesa, soltar traques sem se importar com os outros ou tirar melecas do nariz (mesmo se achando protegido atrás das janelas fechadas, na solidão de um carro vazio preso no meio do trânsito empacado). Ou se por acaso não percebeu, mas faz perguntas e não presta atenção nas respostas. Se você é daqueles que falam no celular com um tom de voz que faz com que os outros ao seu redor (serve a mesma distância da regra do perfume) tenham de participar de todos os seus problemas, suas alegrias e tristezas. Se você não se importa em coçar o saco na frente dos outros (e nesse caso a coisa se aplica aos dois casos, o figurativo e conceitual de não fazer nada e o literal). Se acha que é legal xeretar a correspondência dos outros (a não ser, é claro, que você seja um policial e tenha um mandado do juiz).
Se você é um deles, meu caro, e tem o costume de praticar algum desses atos de uma maneira constante, consciente e deliberada. Se não acha que as regras básicas da boa educação são uma forma de convivência e consideração para com os outros, saiba então que você é, nem mais nem menos, um mal-educado. Ponto.
(1) Uma das coisas que mais me abismam é quando alguém liga para o celular do outro e quer saber logo de cara quem está falando. A regra é clara, quando você vai na casa de alguém é a pessoa na casa que pergunta quem é para quem toca a campainha, não o contrário.
(2) Neste capítulo o cara que para na frente de um portão ou de uma guia rebaixada merece o título de cidadão honoris causa da má educação.
*J. R. Duran, 55, é fotógrafo e escritor
www.twitter.com/jotaerreduran