Um pé lá, outro cá

Yahsmim Lima saiu de uma escola pública na periferia de São Paulo para estudar nos EUA

por Caio Ferretti em

Um pedaço de papel com algumas anotações pendurado na parede do pequeno quarto de Yahsmim Lima chama a atenção: matemática: 9; português: 9; geografia: 10; inglês: 8. As notas são boas, mas, para ela, não o suficiente. “Agora vou tirar 10 em inglês fácil”, diz. Yahsmim, 15 anos, acaba de voltar de um intercâmbio de três semanas nos Estados Unidos. Uma experiência que essa adolescente aluna da rede pública, moradora do Campo Limpo, jamais imaginaria ter.

A história de Yahsmim mudou quando seu pai perdeu o emprego e ela teve que trocar o colégio particular por um estadual. Poucos depois de se matricular na Escola Estadual Presidente Kenedy, Yahsmim viu uma revolução no local. Há cerca de três anos a Associação Parceiros da Educação adotou a escola. “A biblioteca era um lixo, detonada, bagunçada. Tinha carteiras estragadas, paredes pichadas e os professores não iam”, lembra. Hoje, a realidade é outra. “Os professores pararam de faltar e a biblioteca foi reformada. Muitos eram trombadinhas e agora estudam. O interesse existe, só precisava de uma ajudinha.”

A Associação Parceiros da Educação é uma ONG que reúne empresários dispostos a patrocinar escolas estaduais para melhorar o rendimento dos alunos. O idealizador do projeto, Jair Ribeiro, vencedor do Prêmio Trip Transformadores em 2008 na categoria Saber, idealizou o projeto que beneficiou a E.E. Presidente Kenedy – e, consequentemente, Yahsmim.

Inglês desenhado
Além das melhorias, a Parceiros da Educação se juntou à escola de inglês Alumni e selecionou os melhores alunos dos colégios públicos atendidos para um curso de dois anos nas unidades paulistanas. Yahsmim foi uma das escolhidas. “Eu não tinha inglês. Era só ‘I am’, ‘You are’. Não montava uma frase.” E como passava de ano? “Simples, o professor falava: ‘Faz um desenho que te dou uma nota’.” Sim. A prova de inglês era na base do desenho.

No curso, Yahsmim aprendeu rapidamente a nova língua. O suficiente para conseguir se destacar na seleção do programa Access, da embaixada americana, que levaria 25 estudantes do mundo inteiro para um intercâmbio de três semanas nos Estados Unidos. Apenas três brasileiros integraram o grupo, entre eles Yahsmim. Na experiência, a adolescente da periferia impressionou-se com a organização da capital, Washington. “As ruas são largas e limpas”, lembra. Algo que ela não costuma ver nas vielas do Campo Limpo. Conheceu a rotina de famílias da cultura amish na Pensilvânia e mergulhou no mar de San Diego. A rotina era intensa. “Ou estávamos em aula ou visitando pontos turísticos. Quase não tivemos tempo livre.”

Ao contrário do que havia escutado, não achou os americanos muito fechados. Mas sentiu uma diferença em relação aos brasileiros. “Eles são muito mais patriotas, toda casa tem uma bandeira hasteada. Muitos até se orgulham quando falam que o filho está na guerra”, diz. “Eu mesma voltei mais patriota.” Não foi só. “O contato com os outros estudantes foi ótimo. O da Palestina explicou como está a situação por lá. Tinha gente do Líbano, de Kosovo. Lugares sobre os quais eu não tinha conhecimento nenhum.” Yahsmim voltou ao Brasil no fim do mês passado premiada como a segunda melhor aluna entre os 25 que foram. Agora sonha em fazer uma universidade por lá, “Harvard ou Yale”, diz, sem modésta. Mas, por enquanto, só quer poder escrever no pedaço de papel pendurado na parede de seu quarto: inglês: 10.

 

 

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