Tolerância Zero
PT e PSDB devem um pedido de desculpas ao país
O lamentável show de horror também conhecido como campanha presidencial de 2014 entrega para os próximos quatro anos um país dividido e ressentido. Acreditem, a ressaca vai ser grande. O porre presidencial se agravou nos debates do segundo turno. Não que a política brasileira estivesse em um bom patamar antes, mas nesses embates ela entrou definitivamente na rota do esgoto com a proliferação de ofensas pessoais, acusações e respostas desconectadas das perguntas. Tudo ditado pelos marqueteiros.
Como disse Nelson de Sá em sua análise na Folha de S.Paulo, as proclamações do vencedor no final de cada debate pelas claques enlouquecidas, através das redes sociais, foram risíveis. Claramente, perderam ambos os candidatos, se não votos, em civilidade e estatura política.
Os encontros que deveriam simbolizar o nível mais alto da política deixaram de fora a refl exão sobre a questão da água no momento em que São Paulo agoniza e discussões fundamentais sobre meio ambiente, sustentabilidade, ciência, tecnologia e inovação. Às vésperas da Olimpíada, esporte não teve qualquer espaço e, em quase 16 horas de falatório (incluindo os debates do primeiro turno), a palavra cultura não foi sequer mencionada.
Ficou claríssimo que o nível da campanha presidencial foi retrato fiel da qualidade da política brasileira e de nosso processo eleitoral. No primeiro turno, as comparações de propostas se diluíam em muitos candidatos, parte deles folclóricos e de olho nos fundos partidários. No segundo turno, os projetos ficaram em segundo plano. A estratégia da desconstrução – palavra que passa a fazer parte do nosso dia a dia depois desse pleito – tornou-se a única forma de fazer política.
TIROTEIO VERBAL
A sociedade se dividiu e ecoou perfeitamente o clima de guerra. Quem tentou manter uma postura crítica e independente diante da barbárie se viu em meio a um tiroteio insuportável. Os polos eram tão antagônicos que foi possível ser xingado tanto de “petralha patrulheiro” como de “reacionário babão”, ao mesmo tempo. Aconteceu comigo diversas vezes e, muito mais que risadas pela falta de capacidade de discernimento das turmas, bateu mesmo uma tristeza profunda.
O novo governo encara a outra metade do país enfurecida e não vai bastar o diálogo e o discurso de união nacional. O legado dessa eleição foi além da destruição de candidatos. A tal desconstrução afetou as estruturas das pontes que conectavam os dois Brasis. O campo está minado e a tolerância é zero.
Os candidatos deveriam se sentir envergonhados pelo papel que se prestaram e pelo desserviço que fizeram à política nacional. Quantos anos serão necessários para que surjam novos quadros? Quem, em sã consciência, ousaria entrar nesse ambiente político para tentar mudar algo? PT e PSDB devem desculpas ao país.
*Alê Youssef, 39, é apresentador do programa Navegador, da Globonews, comentarista do programaEsquenta!, da TV Globo, advogado e produtor. Seu e-mail é alexandreyoussef@gmail.com