Somos Todos Assassinos
Ex-publicitário lança romance detonando a sociedade de consumo
por Ronaldo Bressane
Se você for publicitário, não leia este livro - a não ser que esteja pensando em mudar de profissão. Em Somos Todos Assassinos, Sebastião Nunes - um mineiro de 62 anos que, depois de passar 23 anos no Rio de Janeiro trabalhando com propaganda, refugiou-se na pacata Sabará (MG) - não mede esforços para detonar a mais velha das profissões [você pensou que era prostituição? Lembre-se que Eva teve de convencer seu público-alvo a comprar seu produto...].Ácido, irônico, sutil feito elefante, Somos Todos Assassinos revela o obscuro mundo que existe por trás de slogans, cases de marketing e campanhas de comunicação de uma certa agência carioca chamada STA. A novidade, aqui, é a forma como conta. Através de anúncios [como os que você vê nesta página], surgem redatores sendo enrabados por empresários, mídias torrando dinheiro bestamente, fotógrafos borrabotas, diretores administrativos que têm por hobby estrangular papagaios - enfim: o universo da propaganda mostrado sem nenhum glamour.Recém-lançado pela Altana - que também publicou de Nunes a provocadora História do Brasil -, Somos Todos Assassinos foi lançado originalmente em 1980, em edição do autor. Daí o livro ter uma estética de provocação pré-Adbusters [o grupo de contra-publicitários canadenses criadores da geléia cultural] que usa a ética da publicidade para temperar textos de variadas densidades: bilhetes, paródias de romances como Vidas Secas e Ulysses, memorandos, contos, piadas. O resultado é uma espécie de romance intersemiótico que mostra a propaganda como um ofício vil - um universo de desclassificados em que todo mundo puxa o saco de todo mundo.Momentos altos: o capítulo Liberdade é uma caderneta de poupança, que reconstitui a agenda de um fútil e hedonista supervisor de atendimento; e o capítulo Anatomia de um anúncio, que começa assim: Para fazer um bom anúncio você deve, em primeiro lugar, despir-se de preconceitos ou preocupações sociais. [...] Se você exibe, porém, tais aberrações psicológicas, poderá enganar a alguns durante algum tempo, mas não conseguirá enganar a todos todo o tempo. Estou falando de seus patrões, colegas e até de você mesmo. Quanto ao público, você sempre conseguirá enganá-lo.Somos Todos Assassinos, de Sebastião Nunes, 92 páginas, R$ 14,40 na www.fnac.com.br