Social Surf
Apadrinhado por Teco Padaratz, projeto social em Floripa resgata jovens jurados de morte
O projeto Procurando Caminhos, do Centro Cultural Escrava Anastácia, procura auxiliar 80 jovens pobres das periferias de Florianópolis envolvidos com o tráfico e consumo de drogas oferecendo aulas de surf e oficinas profissionalizantes. Teco Padaratz, surfista e nativo da cidade, assumiu o papel de padrinho: ajuda a entidade a organizar campeonatos e dá palestras aos garotos e garotas.
Em 2007, 25 jovens de Monte Cristo, comunidade pobre de Florianópolis, foram jurados de morte. Membros de uma gangue, eles estavam na lista negra de rivais de um bairro vizinho, Novo Horizonte. "Eles chamaram as lideranças comunitárias, a diretora da escola, a prefeitura. Conversaram: 'A gente está marcado para morrer e não quer morrer'. Quem era da [secretaria da] educação não pôde fazer nada, quem era da assistência social também não pôde fazer nada, todas os órgãos públicos se eximiram da responsabilidade", conta Adriana Niehues, coordenadora do projeto.
Era importante evitar que os dois grupos de cruzassem, então os garotos de Monte Cristo passaram a contar com a proteção dos integrantes do projeto. Um ônibus foi usado para deslocar os surfistas aprendizes até a praia. Longe da violência e do tráfico começaram a aprender como pegar ondas, receber treinamento profissional, assessoria jurídica e incentivos para voltar à escola. O trabalho se estendeu aos vizinhos rivais, algo que parecia arriscado, mas se mostrou eficiente. Hoje em dia, os ex-inimigos surfam e andam de ônibus juntos.
Desde então, nenhum desses garotos foi assassinado. Quatro comunidades (Alto da Caieira, Pastinho, Monte Cristo e Frei Damião) da capital catarinense hoje podem usufruir do Procurando Caminhos. Segundo a coordenadora, esse tipo de problema é mais comum do que pensa: "São coisas que não são anunciadas. A TV não fala isso porque Floripa é a ilha da magia, do turismo, só alegria. Essas coisas não aparecem mas acontecem bastante em Florianópolis nas periferias".
Apadrinhada por Padaratz, a iniciativa conta com a parceria de quatro escolas de surf filiadas à Federação Catarinense de Surf e pretende ampliar seu alcance. "Estou tentando conectar as pequenas fábricas de prancha, lojas de prancha locais para que possam começar a encarar esses garotos como garotos sérios. É uma molecada que está querendo uma chance na vida", conta o surfista catarinense.
O começo foi difícil. Era preciso separar os jovens das gangues rivais quando havia aulas de surf: "Cada uma saía num ônibus, não podiam ficar na mira do outro, porque matavam mesmo", diz Adriana. Teco Padaratz também teve dificuldades: "Estou começando a conquistar a confiança deles, porque são muito 'pé-atrás'. Quando você chega para conversar, é tudo cara feia; ninguém fala nada. Fica um clima tenso. À medida em que você vai conhecendo, eles vão se soltando, ficando mais à vontade, eles vão chamando o assunto".
Com tantos jovens para atender, a demanda por pranchas aumentou. Por isso, será inaugurada em 2010 uma oficina de shape, para ensinar aos novos surfistas como fabricar e consertar pranchas. Há ainda uma campanha de doação de pranchas para que cada aluno tenha a prancha específica para seu tipo físico. O Centro Cultural Escrava Anastácia ainda organizou uma exposição de arte em pranchas que se encerrou no último fim de semana no Museu Histórico de Santa Catarina. Foram convidados 20 artistas locais para costumizarem pranchas que serão leiloadas. Uma porcentagem das vendas irá para o Procurando Caminhos.
Antes rivais de morte, agora os garotos pegam as mesmas ondas. O receio também parece ter saídos dos pensamentos do padrinho Padaratz: "Eu sempre tive muito medo de andar por esse lugares. Eles são pessoas incríveis, a fim de fazer a coisa acontecer e não têm chance". Ele conta que já há um grupo de alunos querendo montar uma loja de surf de bairro. Nem a coordenadora Adriana Niehues vai escapar da água: por sugestão da diretoria do Centro Cultural, ela vai começar a "cair" a partir da semana que vem. Aprender a surfar era seu sonho antigo, agora mesclado aos novos sonhos que deslizam nas águas de Floripa desde 2008.
Saiba mais: blog do Centro Cultural Escrava Anastácia
Para doar pranchas, ligue para (48) 3224-1151, 8404-5718 ou 9969-2756 e agende uma horário