Sobrevivente

por Luiz Alberto Mendes em

SOBREVIVENTE

 

                 Sujo de tristeza, aflito como os ratos, condenado ao negro e ao nunca mais, estranhou. Ele, pessoa que o mundo repelira e que as muralhas entrincheiraram, estava sendo procurado. Queriam conhecer do que se alimentava sua existência.

                 Como venceu a fome e o exílio? Superou a violência, sobreviveu aos cogumelos atômicos da dor e prolongou-se na vida? Qual o segredo do homem que, caçado nas ruas, teve seu sangue derramado nas calçadas e foi cercado de grades para sempre?

                 Porque a lua de lírios decepada, emoldura seu rosto e a morte o evita? O homem de lágrimas redondas, segue seu caminho de ferro, esparramando-se em palavras escuras.

                 Vive em si. Imagino qu7e deva ter um conjunto de engrenagens que fazem seu tempo andar e um estoque de horas que aprendeu a valorizar.

                 Aprendeu a subverter. Viveu lutando contra a angústia que invadia suas noites, enquando as paredes de sua cela, seu duro esconderijo, se encolhiam. Sofreu de um amor sem uso que pulsava, na atmosfera de chumbo que o cercava.

                 As dores, tão cruas e desnecessárias, o inundaram de compaixão. A agonia de cada dia o solidificou. De derrota em derrota, construiu a vitória de si mesmo. Lucidez era difícil. Não podia gritar o desespero de enxergar. Vivendo uma morte secreta, perdido a um sempre procurar, desceu a seu inferno pessoal para merecer o melhor de si.

                 Seu futuro vive embrenhado em mata indevassável. Olhos carregados de fantasmas, sentia que somente o imprevisível resgataria sua liberdade. Vive como que houvesse nascido na prisão e que morrer preso, seja parte de seu destino de pedra.

                 Despreocupem-se se ainda o temem, afirma. Esta salvo de seus demônios. Não ensinara o segredo. Continuara guardado, em gesto alto, porque ele mesmo não tem resposta. Apenas existe e resiste a cada dia, sobrevivendo a si mesmo.

Composto em 04\03\2004, um mês antes de conquistar a liberdade.

Luiz Mendes

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