Rosa choque
O Festival #ExisteAMORemSP foi um momento único e inesquecível, mistura de arte com ativismo
Não é fácil viver em uma cidade tão despolitizada e individualista como São Paulo. A sensação é de uma constante impotência diante do poder econômico avassalador e dos coronéis políticos que comandam os currais eleitorais da cidade. Durante quase todo o primeiro turno das eleições de 2012, esse sentimento ficou muito evidente e não era incomum achar quem considerasse fugir de São Paulo em busca de horizontes mais libertários. A angústia da vez era plenamente justificada, com a campanha de Celso Russomanno à prefeitura da cidade, que liderava a disputa impulsionado pela força da Igreja Universal do Reino de Deus.
Entretanto, faltando duas semanas para o pleito, algo diferente aconteceu. Depois de um gesto atrapalhado de um importante empresário gay da cidade em favor do candidato pentecostal, as redes sociais começaram a entrar em ebulição, impulsionadas pela indignação de setores expressivos do movimento LGBT. Dois dias depois, outro renomado empresário, ligado à noite e à moda, também se posicionou em favor do líder das pesquisas, o que também causou uma reação forte de setores mais modernos da cidade.
Eu, confesso, estava absolutamente apavorado com a hipótese de vitória de Russomanno e muito triste com o apoio que o candidato recebera de pessoas tão próximas. Para tentar fazer algo a respeito, me reuni com os alguns amigos jornalistas com a turma ativista do Fora do Eixo. Fomos todos para a Praça Roosevelt, onde encontramos produtores, artístas e frequentadores da região. Em poucas horas de cervejas e confabulações, bolamos o slogan #AmorSIMRussomanoNÃO e pensamos na cor rosa como símbolo da alegria, diversidade e transgressão que tanto amamos em São Paulo e que não queríamos perder de jeito nenhum, como que sem esses elementos, ficasse insuportável de vez sobreviver ao cinza da nossa megalópole.
Seguiram-se enormes campanhas diárias pelas redes sociais que atingiram diversas vezes os trending topics da internet e uma manifestação bonita na praça Roosevelt em repúdio ao candidato da Igreja Universal e em favor do estado laico e da democracia.
Parte 2
A festa rosa se repetiu no segundo turno, dessa vez não contra um candidato, mas a favor de uma São Paulo sem caretice e que assumisse de vez sua verdadeira vocação de polo internacional de cultura e criatividade. O #ExisteAMORemSP foi um momento único e inesquecível, em que artistas como Criolo, Gaby Amarantos, Emicida e Thiago Pethit encabeçaram uma lista de nomes de atrações que resgataram a importante mistura de arte com ativismo. A sensação daquela tarde e noite na praça Rosa, antiga praça Roosevelt, era de pertencimento, sentimento tão distante do dia a dia dos paulistanos.
Mais do que contrapor a terrível mistura de despolitização e ganância demostradas pelos empresários adesistas ao líder das pesquisas no primeiro turno, ou atuar em favor de algum interesse político específico, as mobilizações rosa provaram que é possível transformar o futuro da cidade da grana e dos coronéis, mesmo que tenhamos como arma apenas o amor que sentimos por ela.
*Ale Youssef, 38, é criador do Studio SP e do Studio RJ, um dos fundadores do site Overmundo e apresentador do programa Cartas na mesa no canal GNT. Foi coordenador de Juventude da prefeitura de SP (2001-04). E-mail: alexandreyoussef@gmail.com - Twitter: @aleyoussef