Quem precisa de Julian Assange?
Paulo Lima adianta os principais assuntos da Trip 199
A própria ansiedade, o extrato bancário, o filho mais novo, o colesterol, o mercado futuro, o conselho da Vale, o desmatamento, o narcotráfico... Quem viu o controle? A Igreja teria passado pro Estado, que teria deixado escapar para as corporações, que não sabem direito, mas desconfiam terem largado em algum lugar na sala ou no quarto. Mas, diga aí, você ainda precisava que um australiano alvíssimo (definitivamente transparência é a palavra), obstinado, e até certo ponto engraçado, juntasse seu time e desse um jeito de obter e depois espalhar milhões de documentos sigilosos trocados entre governos, instituições públicas e privadas, para entender que não há mais nenhum controle possível? Também não é preciso entoar o cantochão do "impacto da internet" ou "da revolução digital", ou mesmo ler os milhares de documentos do WikiLeaks, que revelam, antes de tudo, o estágio obtuso e infantil em termos de desenvolvimento humano em que se encontram os supostos controladores do planeta.
Esqueça essas coisas e tente dar uma olhada para dentro de onde está o seu olho. Que poder você acha que tem sobre o fluxo dos seus próprios pensamentos? Qual a chance de controlar esse turbilhão contínuo e permanente, que produz, decodifica, emula, processa (e, claro, publica) ideias e sensações todo o tempo, sem parar um instante, inclusive enquanto você dorme?
Hoje é dia 25 de abril de 2011, a segunda-feira seguinte ao feriado de Páscoa. Nas estradas do Brasil foram registrados 3.861 acidentes. 175 mortes. Os números tentam conter, fazer caber na lógica, controlar, de alguma forma. Menos que no mesmo período do ano passado, diz a estatística fria. Um garoto de 18 anos está lá entre outros 174. Era um garoto. Um carro e uma estrada e pronto... o véu do controle, fiado na ilusão, que a gente estica e põe sobre as costas para enfrentar a dureza da vida, se rompe. Bruta e repentinamente como a bexiga que estoura sem avisar no meio da bagunça do bufê infantil, ensinando ao aniversariante que ele pode até ganhar os presentes e escolher o tema, mas não manda de fato na festa. Ao contrário do antigo seriado de TV, na vida real, o Caos sempre supera o Controle.
Dê uma boa olhada nesta Trip... ou pergunte ao surfista que está saindo da água com um sorriso quase imperceptível no rosto, àquele carroceiro domando o peso nas costas e pernas, ou ao sábio que você escolher... melhor ainda, a uma criança pequena, já que estamos falando de saberes incomuns. Só quando percebe que o controle absoluto é uma ilusão absoluta, ele garante alguma chance de continuar de pé. E de se divertir com tudo isso.
Paulo Anis Lima, editor
A edição de maio (#199) da Trip é dedicada à memória de Luiz Felipe Piason