Quadrinhos e rap
Hip hop e HQ são mais próximos do que você imagina; veja alguns exemplos dessa ligação
O rap é conhecido como o som da periferia, da rua, da realidade nua e crua... e dos quadrinhos? Pode parecer estranho, mas desde os primórdios do rap uma ligação de seus artistas com as HQs, sendo fazendo aparições especiais ou mesmo protagonizando histórias próprias - tem até quem baseie sua carreira em personagens de comics.
Tem quem faça pinta de boladão e solte umas beirando a nerdice, como a "I got it mastered, man. In the hood I'm like Plastic Man. Stretch!", do 50Cent. No caso, Plastic Man é conhecido por aqui como Homem Borracha, um cara bem obscuro da editora DC. E a relação entre o som e as histórias é antiga, já no Rapper's Delight, do Sugarhill Gang, tinha o trecho "I said by the way baby what's your name / Said I go by the name of Lois Lane". Ou seja, os dois têm uma conexão antiga e que perdura até hoje.
Agora, do outro lado do espectro, temos o Eminem lutando ao lado do Justiceiro em uma revista online lançada pela Marvel em 2009. Mesmo ano da graphic novel do Ghostface Killah, Cell Block Z, que falava de um boxeador preso por um crime que não cometeu. Um ano antes, era lançada uma publicação homônima ao seu protagonista, "Method Man", desenhada pelo famoso Sanford Greene.
A lista segue comprida - a Rock and Roll Comics número 19 é só sobre Public Enemy e 2Live Crew. Já a edição 37 é dedicada ao Ice T, com o subtítulo fazendo homenagem a seu primeiro álbum, Crime Rhyme. Contudo, tem poucos grupos como o Wu Tang Clan, que, além de terem tido uma revista só deles, pegaram muita influência da arte. Todos tem apelidos envolvendo personagens: Method Man usa Johnny Blaze, o Motoqueiro Fantasma. Ghostface Killah usa Tony Starks, nome do Homem de Ferro, tem um CD com o mesmo nome, "Ironman", e até apareceu no filme (infelizmente, em uma cena deletada). O grupo, bem como os integrantes GZA e RZA, têm capas de disco assinadas por desenhistas de quadrinhos.
Este último, RZA, admitiu em uma entrevista de 2008 para a L.A. Record que passou parte de 1998 procurando crime para combater, em uma roupa a prova de balas e um carro tunado, usando a alcunha Bobby Digital. Segundo ele, a brisa começou porque os federais queria matar o Ol' Dirty Bastard, e ele queria o proteger. Então arrumou um Suburban de 9 toneladas blindado - supostamente, pode levar até tiro de AK. Além disso, usava um terno a prova de balas que custou vinte mil dólares, mas um de seus funcionários o vendeu para um traficante no Brooklyn.
O título do álbum de Jay-Z, Kingdom Come, foi inspirado na clássica minissérie de Alex Ross e Mark Waid, conhecida no Brasil como O Reino do Amanhã. Outro que é um fanboy pesado de quadrinhos é MF DOOM, rapper que tirou sua persona em boa parte de Doctor Doom, um vilão da Marvel. Ele até usa Madvillain como apelido, quando convém. Ele nunca é visto ou fotografado sem a máscara, exceto por imagens da época do KMD, seu antigo grupo. Uma das poucas entrevistas ao vivo com ele é narrada por um jornalista que diz que teve que seguir a um local marcado por uma ligação anônima, um porão, cheio de 'capangas' mascarados com tacos de beisebol, só pra manter o feeling de vilão. Adicionalmente, disserta com experiência sobre quadrinhos e seus personagens.
Há tantas referências e ligações que os quadrinhos podem praticamente serem considerados o quinto elemento do hip hop. A relação entre essas duas culturas vai ser até debatida um dos painéis da New York Comicon, que acontece de 11 a 14 de outubro em NY.
(*) R. Costa escreve para o Coletivo Action, site especializado em cultura negra www.coletivoaction.com