Há década ouvi uma historinha, dessas edificantes e enigmáticas do Zen-budismo, que me esclareceu para o resto de minha vida. Um mestre do Zen esta sentado à mesa com um discípulo que lhe pergunta insistentemente:
_ Mestre, mestre, o que é Zen?
Diante tamanha ansiedade, o mestre se levanta como uma mola flexível, apanha o bule de louça de chá da mesa, com todo cuidado, e despeja chá na xícara do discípulo insistente na medida exata que manda a tradição japonesa. Depois volta o bule, cuidadosamente, para o local da mesa de onde o levantara. O discípulo, sem entender, continua a perguntar:
_ Mas, mestre, o que é mesmo Zen-budismo?
A resposta já fora encenada. Zen é fazer tudo, seja lá o que for, com o máximo de perfeição que se for capaz.
Escritores tendem a ser perfeccionistas, ou são orientados por seus editores para que o sejam. O problema é que essa perfeição é impossível já que somos humanos. Humanos são imperfeitos, logo, o que fazemos também tem sempre sua dose de imperfeição. Caso fosse possível uma tal perfeição, significaria o fim do que criamos. Qualquer mudança seria desaconselhável. Nada mais restaria, nada mais aconteceria. Não há nada mais depois da perfeição. Por isso creio que a perfeição, embora perseguida, seja indesejável. Não conheço nada que de tão perfeito não possa ser melhorado. Tenho contos, alguns publicados no livro "Cela Forte", que fiquei mais de 20 anos lendo e modificando alguma coisa a cada leitura. Eu não conseguiria mudar uma só vírgula neles; mas sei que outros conseguiriam. Não conheço nada que de tão perfeito não possa ser melhorado. A perfeição me parece um eterno vir-a-ser, como nós mesmos; algo para sempre não alcançado. Um desses "ainda não", talvez. Isso nos impõe a mobilidade. O que é perfeito para, e nós, até onde sei, somos passageiros do movimento. "Passageiros da tormenta", como intitulou um de seus discos, o líder da banda The Doors, Jim Morrison.
Há sempre o inacabado em processo de continuidade a um nunca acabar. A vida transborda de palavras, sentidos, imagens e sons, uma tentação irresistível para o escritor. Um desafio, um chamado à composição e à criação. Até um cemitério arde de vontade de ser entendido, explicitado, interpretado ou desenvolvido em um tema.
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