Terça passada, 29/09, eu estava em Salvador/Bahia para o encerramento de Oficina de Poesias, em uma penitenciária feminina. A coordenação era da professora Denise Carrascosa da UFBA, minha amiga pessoal, que fez até o prefácio de meu livro de poesias "Desconforto", publicado pela Reformatório. Tudo ali era favorável, desde a diretoria da casa até a mais humilde das meninas aprisionadas.
Fomos presenteados pelas garotas com um livreto de poesias, tosca e amavelmente (de feito com amor) confeccionado, com pérolas assim:
"Não te vejo
Não te sinto
Não te toco
Mas te desejo"
Grécia
Ou então:
"Um mar
Um cavalo ou uma cobra
E aquela vassoura descansada na parede..."
Poema Coletivo
E muitas coisas mais. Elas falaram, eu falei, a professora, a diretora falou, ao fim e ao cabo, todos nós falamos e trocamos mil abraços e beijos: matamos a sede de gente, de humanidade, que nos matava. Ninguém saiu dali sem um poema, sem muitos beijos e abraços apertados. A emoção transbordou, quem não era de falar falou e até eu que não sou de beijar, beijei, beijei, muito, tudo.
Havia até a Presidente da Academia de Letras da Bahia, uma senhora muito doce e distinta; Karina, a poeta das águas e um escritor das coisas e dos Toques Negros. Veio até a neta de meu mestre Graciliano Ramos: minhas homenagens. Mas uma pergunta cismava em me atormentar: para que serve uma Academia de Letras? Sim havia dois escritores e uma poeta, mas nenhum acadêmico, em que se pese a presença da Presidente da Casa na Bahia. Tenho entrado em prisões, escolas, sociedades amigos de bairros, comunidades e jamais vi um acadêmico de verdade. Alias, não conheço nenhum pessoalmente.
Onde os acadêmicos deveriam estar? Não seria onde se precisa de letras; não são acadêmicos da coisa? E onde se precisa mais de letras que na prisão, nas escolas, comunidades e reuniões culturais das pessoas mais humildes da sociedade? Nunca os vi nesses lugares. Vejo sempre aqueles que, como eu, são batalhadores da palavra, aqueles ainda não bafejados pelo reconhecimento e consagração. Os grandes escritores nunca estão onde seu público deve estar, onde se precisa conquistá-los para o prazer de ler. Vejo-os na televisão em grandes livrarias lançando seus livros, rodeados de pessoas muito bem vestidas e alimentadas. Esses que já se fartaram de tanto ler e quase nada fizeram com o que leram. As pessoas que precisam das letras nem roupa têm para frequentar esses lugares, não saberiam como se comportarem, estão acanhados e com medo do ridículo.
Sou apenas um sujeito metido a escritor, mas já estive em todos os lugares: escolas, comunidades e estou sempre em prisões e não para exibir meus textos. Vou para incentivar as pessoas a lerem; constantemente afirmo que os livros me salvaram e salvam até hoje e que se o dicionário é o pai dos "burros", o livro é o pai dos pobres: a única saída.
Acadêmicos, sei que nem sonham em ler o que escrevo, mas se alguém ler e lhes falar, saibam que continuo a perguntar: Para que servem os acadêmicos?
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