Ninguém é digno de ser bajulado

por Luiz Alberto Mendes em

 

Estranho

 

Na maioria das vezes funcionamos como um colecionador de borboletas. Classificamos o mundo, as coisas e as pessoas, espetamos em um alfinete e pregamos em um quadro de veludo. Tentamos, inutilmente, controlar a fluência da vida ao nível de nosso entendimento. O que não faz parte desse quadro, não existe.

Classificamos a outra pessoa segundo conceitos preconcebidos a partir da desinformação que nos formaram e da alienação que nos impuseram. O negro, o favelado, o pobre, o rico (por incrível pareça!), o malandro, o boy, o inempregável, o “nóia”, o irresponsável, o idiota... e vai por ai afora. E toda essa categorização é de modo a inferiorizar suas vítimas. Colocá-los em baixo de nossa “observação analítica”, qual fôssemos superiores ao exercer a crítica.

Claro, existem aqueles que aprendemos a admirar. Principalmente aqueles que fazem sucesso ou que tememos. Alguns devem mesmo ser admirados por suas realizações. Mas, heróis não duram. Pouquíssimos de nós merecem o título de celebridades e são dignos de serem festejados. Absolutamente ninguém é digno de ser bajulado. Os melhores de nós ainda usam banheiro.

Os testes de Quociente de Inteligência revelam que a maioria esmagadora dos homens tem um padrão médio de inteligência. No entanto são tantos os preconceitos que já nem nos parecemos mais. Classificamos e tornamos o outro um estranho. A outra pessoa esta cada vez mais distante.  Esquecemos as igualdades porque as desigualdades ficaram mais flagrantes e marcaram mais.  

Parece que a outra pessoa só não é estranha quando esta em processo de sofrimento. Estima-se que 1 bilhão espectadores, em 28 países, assistiram a transmissão ao vivo do resgate dos 33 mineiros soterrados por 70 dias em Copiapó, no Chile. O mundo estava em estado de expectativa e ansiedade. Todos, de norte a sul, de leste a oeste, tensos, voltados para a recuperação daqueles homens. Havia uma comoção mundial.

Don Lucho, líder dos mineiros soterrados, afirmou que: “quando chegou a primeira perfuradora ao nosso refúgio, todos nós só queríamos abraçar a broca.” A broca éramos nós, seres humanos emocionados do mundo todo, chegando até eles. Éramos iguais naquele momento. Já vivi situações limite e sei como reagimos ao escapar. Abraçariam um poste e dariam bom dia a uma lata de lixo, tamanha a alegria em voltar ao mundo e, principalmente, aos outros. Ah! Como amamos esse mundo e esses outros... Como conseguimos torná-los estranhos? Não é estranho?

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Luiz Mendes

13/10/2010.

 

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