Netuno nervoso
Prepare-se para surfar como nunca: um swell gigante deverá trazer ondas de até 5 metros
Algumas vezes somos um pouco otimistas demais, mas dessa vez não podemos ser conservadores diante dos fatos. É possível que estejamos prestes a presenciar um dos maiores swells de sudeste deste milênio. Graficamente, ele traz números jamais vistos na era pós-internet em águas brasileiras, e a comparação com o até então intocável swell da Páscoa de 2009 se torna inevitável. A ressalva importante é que se trata de um swell de sudeste, e não de sul, por isso, picos diferentes poderão se destacar. Será um páreo duro. Se no litoral paulista a ondulação será monstruosa, as ondas no litoral carioca poderão entrar para a história moderna do surf brasileiro. Vai ter história para muito tempo e as lendas do surf serão recicladas.
Alguns dos fatores encontrados no DNA da criatura que se desenvolverá nas próximas horas são aquecimento atípico do Oceano Atlântico, El Niño ainda ativo, transição oficial do verão para o outono, choque brusco de temperaturas, astronomia e fusão de tempestades. Oportunidade rara para surfar secrets, ondas gigantes, picos adormecidos e até mesmo ondas inéditas.
WAKE UP, DEAD MAN
Demorou um pouco, mas confirmou-se nossa expectativa de que o Atlântico Sul acordaria ainda na primeira semana de Abril, e a Páscoa sem ondas poderia ser apenas "uma questão de calendário" (Especial Tendências Outono 2010 LD 66, 19/03). Após um fim de semana de incrível volatilidade nos mapas, os ventos - bem como suas mexidas ondas - acabaram chegando um pouco mais cedo e já deram as caras desde segunda-feira, quando alguns picos já presenciaram ondas acima de um metro.
Na sequência, subiu mais um pouco, mas a qualidade, não colaborou muito até então, salvo alguns momentos de pausa nos ventos. O sopro nervoso de Netuno não vai parar tão cedo, continuando a exigir certa astúcia para pontuar um surf ao menos razoável nesta fase inicial do swell n.1. Tudo bem, o show está apenas começando e o melhor ainda está por vir: as ondas durarão pelo menos até terça-feira e o giant surf ainda nem começou!
A bola de cristal estava quente quanto ao segundo estágio desta ondulação e uma rara configuração ciclônica deverá intensificar ainda mais o bombardeio. Depois de mostrar o lado negro da força ao custo de aproximadamente uma centena de vidas, essa tempestade deve trazer o ápice entre a tarde de quinta e a manhã de sexta-feira, passando de 3 metros de sudeste, mas há potencial para que alguns picos especiais passem de 4 ou até mesmo 5 metros - as fotos mostrarão depois. Além disso, deve garantir um fim de semana ainda com altas ondas de sudeste - big surf garantidíssimo!
No primeiro swell da temporada, nem tudo é alegria, mas com um pouco de paciência e atitude, poderemos driblar os ventos e tirar bons momentos dessa bomba de poucas comparações. Vamos com tudo para mais um quebra-cabeça líquido, essa previsão está eletrizante!
Índice:
- Resumo LD
- Tábua de Marés
- Previsão do tempo
- Análise das ondas
1-Resumo LD: O ciclo de vida da criatura
LIQUID DREAMS – Condições predominantes para o litoral de São Paulo
Quarta, 6 de abril
- Tempo: Encoberto com possíveis rápidas aberturas, com chuva fina. Segue frio.
- Ventos: Tivemos uma brecha matinal, mas ao longo da tarde o sudoeste ganha volta com tudo e sopra com forte intensidade
- Ondas: 1 a 1,5m, subindo e podendo passar bater 2m no fim de tarde
- Direção e período: sul/ sudeste - 8 para 9s
- Tendência: Subir de forma prejudicada
- Destaques: A manhã e o início da tarde ainda apresentaram as ondas da primeira fase do swell, com breves momentos de vento ainda entre fracos e moderados (girou bastante e rolou até leste/nordeste por algumas horas), quando alguns picos apresentaram condições mais razoáveis. Nesta tarde o vento SW voltou a soprar forte, mas já girou novamente e a qualidade do surf varia bastante, com alguns picos já bem aproveitáveis. As últimas horas do dia devem trazer os primeiros sinais das ondas ciclônicas. A tendência é de subida, e com as condições indefinidas dos ventos, vale a checada no seu pico. Pode chegar ou passar dos 2m!
Quinta, 7 de abril
- Tempo: Encoberto com possíveis aberturas. O volume de chuva diminui, mas segue o risco de garoa fina a qualquer momento. A sensação de frio aumenta com os ventos
- Ventos: Sudoeste com alta intensidade, podendo passar dos 20 nós em diversos picos
- Ondas: 2 a 3m, com maiores. Picos especiais já poderão superar 4m.
- Direção e período: sul/sudeste, virando para sudeste - 10 para 12s
- Tendência: Subida explosiva com qualidade ameaçada na maioria dos picos. O fim de tarde deve estar gigante.
- Destaques: ALTAS! O mar já acordará muito nervoso, pesado e com formação ainda prejudicada na grande maioria dos picos (muitos estarão fora de controle). Ao longo da madrugada os ventos serão impiedosos e a indicação é de que continuem fortes ao longo do dia (ápice do ciclone). O fato deles terem girado no dia anterior abre a possibilidade de que isso repita e possibilite surpresas, ainda que os mapas não indiquem isso. Há potencial para passar dos 3m durante a tarde (começo do ápice), mas para isso tal fundo deverá suportar esse tamanho. Pra um surf mais amigável, alguns picos alternativos, mesmo que bem menores, serão uma boa opção caso sejam protegidos ou recebam o SW como terral. Corrente animal e remadeira sem fim são riscos a serem calculados.
Sexta, 8 de abril
- Tempo: Encoberto com possíveis aberturas. Segue o risco de garoa fina a qualquer momento.
- Ventos: Começa a aliviar. Vento sul (Sul/ sudoeste a sul/ sudeste) com intensidade fraca a moderada.
- Ondas: 2 a 3m, com maiores. Picos especiais poderão superar 4m
- Direção e período: sudeste, 12 a 13s
- Tendência: Hora da verdade: Provável ápice da criatura.
- Destaques: ALTAS! Com a indicação do ápice ocorrendo nesta manhã, maré enchendo e redução nos ventos a chance de termos um surf gigante com condições no mínimo regulares são as mais altas desse swell! Se vc quer "THE REAL THING", esse é o dia. A maré seca ao longo de toda a tarde e a tendência é de leve aumento nos ventos no meio do dia (pode girar um pouco). As ondas seguem muito grandes e a exemplo do dia 8 do mês anterior, vários secrets deverão mostrar seu potencial. Só vai saber quem estiver na cara do gol... Boa sorte!
Sábado, 9 de abril
- Tempo: Encoberto com possíveis aberturas. Segue o risco de chuva a qualquer momento.
- Ventos: Indicação de poucos ventos durante todo o dia, podendo soprar uma brisa de sul, sudeste e até leste. Ainda assim, algumas rajadas não estão descartadas.
- Ondas: 1,5 m a 2m, com alguns picos ainda maiores
- Direção e período: sudeste, com influência de leste - 12s
- Tendência: Começa a baixar e ganha mais inf. de leste, mas a qualidade tende a aumentar
- Destaques: ALTAS! O mel (em termos de qualidade) deste swell pode estar neste dia, pois os ventos finalmente parecem dar trégua de verdade e ainda há potencial para 2m, podendo passar disso especialmente pela manhã, com a maré enchendo. As ondas estarão de sudeste a sudeste/leste e o litoral paulista inteiro deverá quebrar com qualidade entre razoável a boa, mas poderemos ter momentos excelentes com o afastamento do núcleo do ciclone. Surf garantido o dia inteiro, imperdível mesmo para já surfou o ápice da bomba. Ainda há potencial para picos alternativos.
Domingo, 10 de abril
- Tempo: Nublado, mas tende a melhorar e podem surgir aberturas mais consistentes. Ainda assim, há risco de momentos de garoa prolongada
- Ventos: Indicação de poucos ventos durante todo o dia, podendo soprar uma brisa de sul, sudeste e até leste. Durante a tarde pode acelerar um pouco de sul.
- Ondas: 1,5m com possíveis maiores nos preferenciais
- Direção e período: leste/sudeste, 12 para 11s
- Tendência: Baixa gradativamente ao longo do dia, ainda com boa pressão
- Destaques: ALTAS! Se você ainda não surfou, aproveite. Segue baixando mas com surf firme e forte, provavelmente mais consistente nos picos de leste e sudeste. O período da manhã mais uma vez deve guardar os maiores, e provavelmente melhores momentos. Os ventos devem colaborar de novo, mas há risco do sul dar uma acelerada durante a tarde. Variações de maré aumentam com a proximidade da lua nova e começam a pesar mais. FDS show de surf, não vacile!
2- Tábua de Marés de São Sebastião sob a lua minguante:
QUA |
| QUI |
| SEX | |||
07/04/2010 |
| 08/04/2010 |
| 09/04/2010 | |||
00:30 | 0.8 |
| 00:45 | 0.9 |
| 00:34 | 0.9 |
07:39 | 0.7 |
| 06:13 | 0.6 |
| 06:21 | 0.5 |
11:00 | 0.8 |
| 11:19 | 0.9 |
| 11:41 | 1.0 |
15:43 | 0.4 |
| 16:47 | 0.3 |
| 17:41 | 0.3 |
3- Previsão do Tempo: Continua frio, mas o pior já passou
As chuvas presenciadas no Rio de Janeiro e São Paulo são geradas pelo avanço de uma massa polar sobre as águas atipicamente aquecidas do Atlântico Sul. Ela se carregou de umidade e transporta muita água do mar para o continente, e por isso a situação caótica atual, principalmente no RJ.
As temperaturas devem manter as mínimas abaixo dos 20º por aproximadamente uma semana. Os ventos constantes do quadrante sul continuam ativos até sexta-feira e ajudam a intensificar a sensação de frio.
A chuva tende a diminuir em quantidade, mas ainda pode rolar de forma leve e constante, no estilo garoa fina e persistente nos próximos dias e devendo diminuir a partir de sexta-feira. O tempo segue nublado, mas já deveremos ter aberturas ocasionais nos próximos dias.
Ou seja, semana fria, com vento e chuva fina. Pancadas e temporais estão descartados, pois não condições para mudanças abruptas, uma vez que o quadro já é bastante complicado.
Prévia do fim de semana
A situação deve esboçar uma leve melhora na quantidade de nuvens e tudo indica que poderemos ter bons momentos de sol. As máximas se elevam um pouco (na verdade, sobem só na semana que vem), mas as noites continuam frias até onde a vista alcança. A possibilidade de chuva, por enquanto, é real, seguindo o estilo garoa fina e duradoura.
Outros Estados
Após deixar a capital fluminense no caos, as chuvas deverão subir e os próximos estados ameaçados são Espírito Santo e Bahia, especialmente a área metropolitana de Salvador, nesta quinta-feira.
4- Análise das Ondas: SUDESTE MONSTRO * HUGE SURF ADVISORY *
Para quem gosta de acompanhar as previsões, está difícil desgrudar os olhos dos mapas. Uma verdadeira montanha russa de dados, alternando ajustes de ondas e ventos para cima e para baixo a cada leitura. Os modelos reproduzem as projeções atualizadas, e nós tentamos enxergar o que vai rolar na prática por trás dessa verdade mutante. Vamos aos fatos.
Movimentações no Atlântico Sul: Agora é o que o ciclone vai se formar
As ondas que presenciamos neste início de semana foram são geradas por pistas de sudeste de média intensidade, mas muito próximas a costa. No geral trouxeram ondas de até 1,5 metros, com algumas um pouco maiores, e formação prejudicada (salvo breves momentos de pausa nos ventos em águas rasas), tipicamente um windswell.
O principal mérito desse sistema não foi exatamente a primeira fase do swell n.1, mas sim o fato de ter "furado a bolha" que impedia a formação de swells de verdade. Após ter aberto a porteira, esse sistema começa a se fundir, hoje, quarta-feira, com uma segunda tempestade a leste do RJ. Além disso, ainda se beneficia de um terceiro sistema mais ao sul, que também ajuda a fermentar seu núcleo. Eis que surge uma formação ciclônica claramente definida, sendo ela a responsável pelos eventos extremos dos próximos dias.
Vejamos alguns pontos de atenção nesta nova tempestade:
- O primeiro deles é o porte do ciclone. Com diâmetro de quase 2 mil km, possíveis ventos entre 45 e 50 nós durante o ápice e praticamente estacionado por mais de 50h, ele já reúne as características necessárias para gerar uma ondulação de respeito sob qualquer análise.
- O segundo, tão ou mais importante quanto, é a localização deste monstro. Pelos nossos cálculos, o vortex ("olho" do ciclone) estará a menos de 1,5 mil km a sudeste da costa paulista, e para o surf isso significa que as ondas terão que viajar muito pouco para chegar até a costa sudeste do Brasil. Na prática, segundo as lições de wave decay, isso se traduz em força bruta, com pouquíssima energia dissipada ao longo do caminho.
- Sendo assim, possui diversas características que, uma vez confirmadas, poderiam classificar essa enorme tempestade como um raro caso de ciclone tropical, o que tecnicamente não existe no Atlântico Sul. Algumas delas: local de origem, olho bem definido, ventos máximos sustentados próximos ao núcleo, desenvolvimento sobre águas relativamente quentes (tipicamente tropicais), deslocamento para oeste (em direção ao continente, e não se afastando dele) em baixa velocidade, entre outros fatores. A análise após o evento trará respostas mais claras, e pode estar aí a chave deste enigma. Caso seja realmente classificado como tal (a outra possibilidade seria um ciclone subtropical), alguns conceitos terão de ser revistos.
Somente para efeito de comparação, se esse swell fosse de sul, esse ciclone provavelmente teria um potencial de destruição ainda maior, mas no litoral gaúcho e catarinense.
Riscos: Correntes traiçoeiras e navegação extremamente arriscada, até mesmo para embarcações de maior porte. Toda atenção é pouca, vai ser animal mesmo. Leash apropriado, juízo e companhia não fazem mal a ninguém.
Está dado o recado. Se você ficou tremendo para conferir "aquele" secret na sexta-feira, aproveite a queda de temperatura, prepare o terreno, comece a ficar doente e marque a sua consulta com o Dr. Oceano nesta data. Se não conseguir, relaxe. O FDS deve guardar altas bombas!
Abraço e boas ondas!
Liquid Dreams
Twitter LD >>> @liquidsurf