Nada é Gratuíto

por Luiz Alberto Mendes em

 

Chego à conclusão de que tudo é extremamente importante e que tudo tem um sentido de existir. Mesmo aquilo que é o que há de pior, tem que ser considerado. O medo, por exemplo. Não há nada pior que o medo para o desenvolvimento humano. É uma sensação nefasta que nos bloqueia, imobiliza e faz um mal devastador na auto estima. O medo trava. No entanto, se não houvesse o medo provavelmente já nem existíssemos como espécie. O medo nos preserva, embora não resolva as pendências da existência e até as obstrua por vezes.

Outra mazela odiosa é o egoísmo. Quanto mal faz a ganância proveniente do egoísmo à natureza humana... Sempre a idéia de ter mais, mais e mais até um ponto que nem se tem como gastar. Um milionário que possua 10 carros importados, 10 mansões; só vai poder usar um carro e uma casa de cada vez. Aos egoístas ao excesso restam as consequências, mas e as suas vítimas? Porque nada vem do nada e o excesso de uns é a miséria de outros. Há sempre alguém tirando lucro da miséria de outrem. Não podemos esquecer que é o egoísmo humano que vai destruindo as matas, poluindo o ar, os rios e o planeta todo. No entanto, caso fôssemos destituídos de egoísmo, estaríamos ainda vivendo nas cavernas, isso se conseguíssemos sobreviver. Não teríamos construído nossas cidades, não teríamos carros, ruas, aviões, energia, computador e nossa civilização. Também o egoísmo tem sua necessidade e sentido.

Podemos também examinar outras dificuldades do espírito humano, como a vaidade, por exemplo. A vaidade pode levar as pessoas ao ridículo e acabar com elas, como nos implantes de silicone clandestinos e operações plásticas desnecessárias. Existe a vaidade intelectual que torna suas vítimas pedantes e se achando. Mas a vaidade conserva corpos, torna as pessoas mais bonitas, mais inteligentes, desejáveis e atraentes. A vaidade pode refinar.

O orgulho também é considerado um mal. Melhor a humildade e a aproximação com a realidade. Afinal, somos todos diferentes uns dos outros, mas iguais no que consideramos básico para a existência. Por exemplo, todos usamos o banheiro. Sim, somos melhores e piores uns que os outros, mas há uma média do ser humano e disso é impossível escapar. O orgulho pode separar e destruir. Por outro lado, o que seria de nós sem o nosso orgulho pessoal, nossa honra, nossa moral e auto estima? Eu não teria sobrevivido lúcido e são à prisão se meu orgulho não fosse maior que a dor. Meus parceiros se mataram ou enlouqueceram no cumprimento da pena.

A cultura transformou a agressividade humana natural em violência, essa atitude que destrói. Hoje a expansão da violência excede a capacidade humana de controlá-la. Nosso país, sempre campeão no que há de pior, tem um dos maiores índices de violência do mundo. Há índices científicos que indicam que grande parte da violência provem da desigualdade social. Mas se a violência é maléfica, promove a guerra e a destruição, sem a agressividade que a antecede, não caminharíamos além das selvas e cavernas. Por sermos agressivos é que construímos e corremos atrás de nos ultrapassar.

Parece que absolutamente tudo é aproveitado até o bagaço. A civilização nasce do egoísmo, da vaidade, do medo, da agressividade, do orgulho e de outras atitudes que serão consideradas indesejáveis, posteriormente. Provavelmente estamos jogando esses bagaços fora porque vai chegando a hora da ultrapassagem. A generosidade, o amor, a solidariedade, a caridade, o carinho, a paz, as amenidades, o conforto parece que aos poucos, através dos milênios, vão se instalando na natureza humana como valores superiores a serem conquistados. Mas como afirmamos a princípio, agora concluímos que tudo tem sentido e segue até o fim de sua utilidade, quando é descartado. Nada esta gratuitamente.

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Luiz Mendes

30/09/2014.     

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