Muito além do videogame

Como um jogo com sensor de movimentos está transformando vidas

por Luiz Filipe Tavares em

Desde que foi lançado pela Microsoft em novembro de 2010, muita água já passou por baixo da ponte do Kinect. O sensor de movimentos criado para expandir a base de usuários do Xbox 360 chegou ao mercado prometendo revolucionar a indústria de games, mas acabou tornando-se o ponto de partida para muito mais do que isso. Com o Kinect, não é necessário usar nenhuma espécie de controle, já que todas as funções do console são ativadas por meio de gestos ou comandos de voz.

Desenvolvido sob a supervisão do brasileiro Alex Kipman, o periférico funciona com tecnologia range image, que interpreta as distâncias entre o objeto analisado (o jogador) e a fonte (o próprio Kinect), recriando em 2D o ambiente real captado pelas câmeras do aparelho. Menos de um ano depois do lançamento do videogame, essa tecnologia única já serve como base para diversos experimentos de inclusão, tão abrangentes que vão desde a pesquisa com robótica e inteligência artificial até o mapeamento de terrenos e o tratamento de pessoas com deficiências visuais e intelectuais. 

O preço é um diferencial para a tecnologia embutida no Kinect. Na universidade de Warwick, na cidade inglesa de Coventry, o periférico possibilitou a construção de um premiado robô de resgate, projetado para procurar vítimas sob os escombros espalhados por terremotos e deslizamentos. Usando o mapeamento digital do Kinect, o time de engenheiros da universidade britânica conseguiu economizar pelo menos £2 mil (aproximadamente R$ 5.600) por unidade produzida. Sem o Kinect, fontes alternativas da mesma tecnologia poderiam multiplicar o preço de produção de cada robô em até três vezes. 

Ainda no campo da robótica, o projeto Bilibot incorporou o Kinect como os "olhos e ouvidos" de seus robôs, derrubando o preço de cada um para pouco mais de US$ 1 mil, muito mais barato do que qualquer unidade básica robótica do mesmo porte. Outra iniciativa pioneira que explora a funcionalidade e o preço relativamente baixo do Kinect tomou forma como um projeto de alunos da universidade de Konstanz, no sul da Alemanha. Lá, o console vem sendo usado no desenvolvimento de um dispositivo que ajuda cegos a se locomoverem de forma segura, transformando o mapeamento do ambiente em sinais auditivos e táteis que auxiliam os deficientes visuais a identificar obstáculos em seu caminho. O equipamento ainda está em fase experimental, mas já aponta novas possibilidades para o desenvolvimento de tecnologias de auxílio a portadores de deficiências sensoriais.

Kyle e o Kinect

John Yan escreve sobre videogames no site GamingNexus e é pai do pequeno Kyle, hoje com seis anos de idade. Aos 3, Kyle foi diagnosticado com autismo e vem desenvolvendo pouco a pouco suas habilidades motoras e sociais com o auxílio de terapia ocupacional. No ano passado, quando seu pai comprou um Kinect para resenhar os jogos, pela primeira vez, o menino foi capaz de jogar sem a frustração de não conseguir lidar com os controles. Em pouquíssimo tempo ele começou a dominar os comandos nos jogos mais simples do console e hoje já é capaz de jogar em diferentes plataformas, usando um tablet e até operando o mouse em minigames de computador.

"O videogame realmente tem ajudado meu filho a resolver seus problemas com habilidades e comunicação"

"Ele aprendeu a navegar sozinho pelos jogos e nos sites infantis que ele gosta. Ele é ótimo em descobrir quais botões apertar para continuar jogando, mesmo que sua leitura não seja muito boa. Por conta dos jogos de esporte do Xbox 360 ele começou a se interessar muito mais por esportes como o futebol, que hoje ele joga com os amigos no quintal", contou Yan. "Sem dúvida o Kinect ensinou para ele como funciona a competição e a necessidade de seguir as regras dos jogos. O videogame realmente tem ajudado meu filho a resolver seus problemas com habilidades e comunicação. Com os games, ele conseguiu entender que alguns símbolos são universais e faz associações que são bastante complexas para crianças com autismo."

"Depois que eu escrevi um artigo sobre Kyle e o Kinect, muitos pais de crianças autistas me escreveram para falar a respeito disso. Muitas histórias apareceram com pessoas contanto que o Kinect também estava ajudando outras crianças que não conseguiam jogar antes disso. Para um pai, é ótimo ver que seu filho venceu uma dificuldade e adquiriu esse tipo de independência. Depois do Kinect, nunca mais tive que ajudá-lo a encontrar vídeos ou jogos em sites como o da Disney ou da Nickelodeon", continua o pai de Kyle. "Ele agora está tão confortável usando aparelhos eletrônicos que é até difícil dizer que ele tem autismo enquanto está jogando." 

Crédito: Divulgação
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Crédito: John Yan
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