Lembrar é afagar devagarinho...

por Luiz Alberto Mendes em

 

Lembrar

 

Do que sei, nenhum de nós quer ser esquecido. Há quem tenha motivos para ser esquecido. Mas creio seja exceção, só para confirmar a regra. Desconfio que, além dessa existência pessoal e intransferível, nós construímos outra existência real na mente e no coração dos outros que nos é extremamente cara.

Quando morremos fica tudo para trás. Dinheiro, posição social, carros, casas, empresa, posses em geral, até o nosso corpo termina para nós. Morremos, acabamos. Mas continuamos vivos na lembrança dos que nos amaram. Estaremos vivos naquilo que fizemos e que marcou como exemplo e, particularmente como arte. Todos “imortais” da literatura estão mortos, não há dúvidas quanto a isso. Mas, paradoxalmente, são mais importantes e influentes a partir de suas obras imortais do que quando vivos.

As obras de Platão e Aristóteles vêm formatando o raciocínio do Ocidente há milhares de anos. Shakespeare vem influenciando o comportamento e a arte humana com suas obras há 500 anos.

A lembrança é uma espécie mais específica de afeto. Lembramos também pessoas que nos fizeram mal, mas assim já querendo esquecer, apagar da mente. Como é mesmo o nome do sujeito que matou Gandhi? Ninguém lembra, e foi um fato histórico. E o Mahatma Gandhi será lembrado para sempre com profundo afeto por toda humanidade. Aquelas recordações mais afetuosas, guardamos envoltas em veludo macio. O poeta Antonio Cícero é quem melhor traduz o ato afetuoso de guardar: “Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por/Admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.”

Ser lembrado é um afago prolongado, um carinho profundo. Uma necessidade tão sutil que pode ser alimentada apenas por um olhar ou um sorriso iluminado.

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Luiz Mendes

13/10/2010.

 

 

 

 

 

 

                                                                                          

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