Jean Paul e Simone

por Luiz Alberto Mendes em

Meus Heróis

 

Cultivo algumas paixões que permanecem nos anos, até nas décadas. Elas dão substância à minha existência, parâmetros e sonhos. Há um casal que amo profundamente. E sou extremamente fiel a esse amor. Tanto que ambos já morreram e eu continuo a cultuá-los. É Jean Paul Sartre e Simone de Beauvoir. Os nomes já soam bonito, são expressivos, convincentes. Há algo de mítico, de simbólico e para mim, um verdadeiro modelo de vida a dois. Um ideal de casal. Duas pessoas livres, fisicamente soltas que percorreram o mundo incansavelmente, sempre lado a lado. Estiveram aqui no Brasil e uma biógrafa de Jean Paul afirma até que ele teve uma namorada aqui. Estiveram na casa de Jorge Amado e outras pessoas famosas de nosso país.

Tenho uma paixão especial por Simone. Acho-a linda, profundamente interessante e altamente desejável. Vestida com seus sensualíssimos turbantes e uma moda que não seguia a moda de sua época, algo que ela inventava para si e que compunha sua elegância de mulher alta e magra. Teve também seus amores, em especial um norte-americano cujas cartas trocadas transformaram-se em um livro. Seus romances são altamente psicológicos e existencialistas; sua auto-biografia é a biografia do casal. "Cerimônia do Adeus" é altamente revelador da vida do casal. Seu livro "O Segundo Sexo" é um marco. É dele que saem as idéias que vão dar corpo ao feminismo e onde as mulheres vão beber de suas liberdades e direitos.

Sartre já é baixo e atarracado, completamente descontraído até em terno e gravata ou em uma roupa bastante usada, fumando seu cachimbo que nunca foi de paz. Teve muitas amantes: Dolorès nos States; Lena na União Soviética; Tomiko no Japão; Cristina aqui no Brasil e outras tantas; o romance "A convidada" de Simone dá uma idéia bastante aproximada da vida que eles viviam. Esteve envolvido em todos os conflitos de sua época, junto com sua companheira. Apoiou diversos grupos radicais, dos "Panteras Negras" americano à "Guerra da Argélia". Foi simpático ao marxista, maoísta e abandonando todos para formular o seu modo próprio de pensar. O existencialismo é fruto de profunda reflexão, exposta no seu discurso que virou livro "O existencialismo é um humanismo?" Particularmente, gosto mais de sua peça "Entre quatro paredes", embora sua trilogia romanceada "Os Caminhos da Liberdade" seja fabulosa. São 46 livros publicados enquanto vivo e 10 póstumas. O homem foi biografado 19 vezes.

Considero a vida de ambos como casal uma alternativa à instituição hoje fracassada do casamento convencional. Amantes, lendários, companheiros, militantes e parceiros em idéias e procedimentos. Cúmplices na busca da honestidade de transformar pensamentos em prática, para além das tradições mortas que eles jogam a pá de cal. Ela seca, ele doce; chamava-a de Castor, um casal não-conformista, para além da autoridade.

Para exemplificar a dedicação dela a ele, uma de suas biógrafas, Annie Cohen-Solal, conta que Simone lhe entregou conferências inéditas do companheiro já falecido e, no meio delas a biógrafa encontrou traduções de obras de John dos Passos e de William Faulkner. A maior parte do que Sartre conhecia sobre a literatura americana e inglesa havia sido traduzida por ela e à mão.

Meus heróis morreram mas permanecem vivos aqui em minha mente e no meu coração. Estudá-los sempre é minha homenagem; aprender e falar deles é a prova de meu amor por eles.

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Luiz Mendes

20/11/2014.   

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