Histórias

por Luiz Alberto Mendes em

Histórias

 

Em uma entrevista a atriz Silvia Bandeira, ao ser perguntada sobre o que a atraia em um homem, respondeu dizendo que o que mais podia atraí-la em um homem era que ele tivesse uma história, um conteúdo. Partindo dessa resposta e generalizando, afirmo que é preciso que tenhamos histórias porque é de história que somos feitos. É da densidade do que vivenciamos que somos forjados. E é a partir dessa potência que nos definimos quanto às nossas posições diante da vida. Mas essas histórias precisam ser pensadas, filtradas e transformadas em estruturas de personalidades. Quem muito sofreu, se não refletir e conseguir encaixar suas histórias em uma lógica existencial, torna-se um revoltado. Alguém cujas dores mal digeridas, transforma tudo em amargura e azedume existencial. Alguém destruído para o convívio, uma pessoa que não conseguiu aproveitar da vida suas duras lições. Revolta não é rebeldia; revolta não é indignação, antes é desejo de mal, de revanche e retaliação. Quem sofreu e pensou nas dores que viveu, lembra que existem outras pessoas que também sofreram e que podem ter vivido dores piores que as suas, então desenvolve o sentimento de compaixão. De respeito pelo sofrimento dos outros e torna-se incapaz de promover mais sofrimentos. Aprende que não se pode fazer aquilo que se censura nos outros. Era isso o que quer nos dizer o "perdoa teus inimigos". Não podemos fazer o mal que nos fazem porque então estamos nos igualamos aos que mal nos fazem. E não há nada pior do que sermos identificados pelo mal que identificamos em nossos algozes. Não quero ser como aqueles que abusaram de mim quando criança e adolescente. Não tenho a perversidade e estupidez daqueles "investigadores de polícia" que me torturaram por meses no DEIC. Não conseguiria ser como os guardas de presídio ou policiais do choque da PM que brutalizaram minha existência por mais de 30 anos. Sequer os odeio, desprezo ou sinto vontade de me vingar. Tenho compaixão pelo que eles fizeram deles mesmos; pessoas más, brutais, estúpidas e desumanas. Eu, pelo contrário, escapei de suas garras muito melhor do que era. Muito mais consciente, compreensivo, amigo, humilde, inteligente e humano. Eu tenho história que posso dizer e contar, e não um conjunto de segredos, revoltas e mazelas que preciso esconder de meus filhos, de meus amigos e de todos. Tornei-me capaz de amar, de estar disponível para ajudar, servir e me interessar pela vida das pessoas. Não tenho um passado escondido que vai me enlouquecer e me tornar nocivo e inviável ao convívio humano. Tenho história e conteúdo.

                                              **

Luiz Mendes

11/05/2015.

 

 

Arquivado em: Trip