“Meu pai construiu uma casa nova e disse que era hora de eu arranjar uma esposa. Fui com um grupo de amigos até o dormitório da universidade e roubei Aigul do seu quarto. Ela estava sem sapatos e de pijamas”, conta Bekzat
“Ala kachuu”, no idioma do Quirguistão, significa pegar alguma coisa e sair correndo – incluindo aí moças que mais tarde virarão noivas contra a vontade. No país da Ásia Central, um terço dos casamentos funciona sob uma ética dos tempos da caverna: o rapaz escolhe a felizarda, a leva à força para casa e, junto da família, tenta convencê-la do matrimônio. Caso obtenha sucesso – e, na maioria das vezes, obtém –, na manhã seguinte ela já estará de véu e grinalda.
Algumas noivas são raptadas por amigos, outras por homens que nunca viram na vida e umas poucas escapam após violentas provações. Mas a maioria prefere aceitar seu destino por apego às tradições muçulmanas do país. Após passarem forçadamente a noite na casa de um homem, elas não aguentam viver com sua virgindade e pureza postas em questão.
Os “ala kachuu” foram banidos durante o regime soviético no país e continuam ilegais, porém os sequestradores são raramente condenados. Desde a declaração de independência do Quirguistão, em 1991, o número de sequestros galopou, por uma série de razões: são tidos como parte da identidade nacional; existem poucos espaços na sociedade para os dois sexos se misturarem, mas há uma forte pressão para que os homens arranjem uma esposa até uma certa idade; para as pobres famílias quirguizes, a modalidade anacrônica de matrimônio sai bem mais em conta do que os casórios tradicionais com suas cerimônias cheias de pompa.
9. Aizat foi capturada três dias antes da foto por um estranho. Por um mês, ficaria na casa do noivo sendo exibida para amigos e familiares. Uma visitante coloca nela uma burca – como nora, ela deve usar o lenço na cabeça sempre que estiver junto da nova família. / Créditos: Jackie Dewe Mathews
1. Sophia na cozinha com a nova sogra. Ela já havia sido sequestrada antes, mas conseguiu escapar. Na segunda tentativa que sofreu, foi forçada a ficar. Como é a mais nova das noras, é obrigada a cuidar dos trabalhos domésticos mais pesados. / Créditos: Jackie Dewe Mathews
6. Bekbosun e Bubakan no seu 60º aniversário de casamento rodeados pela família. Ela foi sequestrada a cavalo, no dia em que Bekbosun comemorava 20 anos – idade em que a pressão para se achar uma noiva já começa. / Créditos: Jackie Dewe Mathews
7. “Eu nunca teria ficado se tivesse uma escolha”, desabafa Sophia. Ela já era noiva de outro homem quando Artyk a sequestrou. A avó do rapaz convenceu a jovem a aceitar o matrimônio. No Quirguistão, a opinião dos mais velhos é sagrada; desrespeitá-la é pecado. / Créditos: Jackie Dewe Mathews
3. Convidados agradecem pelo banquete da festa de casamento de uma moça raptada três dias antes. É tradição a família do noivo abrir as portas de casa para exibir a nora. Um animal é assado e as festas duram até um mês. / Créditos: Jackie Dewe Mathews
2. Os irmão Bekzat e Azat casam-se com Ainura e Aigul, suas noivas raptadas. Aigul namora Bekzat há tempos, mas Ainura sequer conhecia Azat. Os “ala kachuu” raramente são registrados, deixando as mulheres sem qualquer direito legal. / Créditos: Jackie Dewe Mathews
8. Ovelhas, cavalos, vodca e doces são alguns dos presentes típicos que os pais do noivo-sequestrador oferecem para a família da vítima após o matrimônio, numa cerimônia conhecida como “achu-basar”. Eles simbolizam agradecimento e um pedido de desculpas pelo ato do filho. / Créditos: Jackie Dewe Mathews
4. Omurbai e Meerkan recebem 160 convidados em sua residência para apresentar a nova nora. Omurbai recém retornou da casa da menina, onde foi pedir perdão pelo gesto do filho e oferecer presentes. Ele foi bem recebido e agora as duas famílias celebram juntas. / Créditos: Jackie Dewe Mathews
5. Um grupo de garotos à caminho do casamento de duas meninas raptadas por dois irmãos. Carros são frequentemente usados pelos sequestradores, que contam com a força dos amigos para “convencer” a moça escolhida. / Créditos: Jackie Dewe Mathews
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