Nas curvas do destino

por Jr. Bellé
Trip #272

Agatha Moreira abandonou as passarelas e abraçou a carreira de atriz depois que um acaso a colocou nos palcos. Depois de estourar em Verdades Secretas, ela estrela 2 longas e está em sua sexta novela

Da sinuosidade das curvas do destino e suas marés desconcertantes é que se aprende a cartografar as decisões mais imprescindíveis da vida e a mapear os desejos verdadeiramente sinceros do coração: Agatha Moreira é a prova viva e deslumbrante de que tomar para si o quinhão que te cabe vai além do entendimento dos ventos – por vezes é preciso soprar as velas, especialmente nos dias de calmaria. Assimilar essa sabedoria, contudo, toma tempo: até o dia em que o destino lhe pregou uma peça – uma peça de teatro chamada Os sete pecados capitais –, ela não sabia o que queria fazer da vida, qual rumo tomar, e deixou o barco do acaso seguir seu curso até que a bússola em seu peito estivesse acurada.

Tudo começou em Olaria, no Rio de Janeiro, onde passava as semanas da infância entre a casa do pai e a da irmã, logo em frente. “Minha irmã morava com o marido e a família dele, então todos meus primos, que não são de sangue, são na verdade irmãos. E tem também a família da minha mãe, com a qual eu ia passar os fins de semana. Sempre tive muita gente ao meu redor, guiando minha vida.”

Foi exatamente um dos membros da família, sua tia Lea, quem a aconselhou, já aos 13 anos, a tentar um teste na agência Elite. “Aí fiz meu primeiro book, participei do concurso e fui com outras 20 meninas para São Paulo. Foi quando comecei a trabalhar. Mas foi tudo ideia da minha tia”, lembra. “Era uma coisa que não tinha passado pela minha cabeça, mas, quando entrei naquele meio, adorei. Até hoje eu gosto muito de fotografia, tanto de fotografar quanto de ser fotografada. Virou uma paixão, muito além da vida de modelo, mais pela fotografia.”

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Sua carreira no mundo da moda a fez ancorar em portos distantes e estranhos. Um deles foi na Coreia do Sul, onde passou seis meses modelando, quando ainda tinha 18 anos. “Era tudo muito novo, uma cultura completamente diferente. Só de ir para outro país, onde ninguém fala sua língua, precisar se virar sozinha, isso já é uma experiência rica, um amadurecimento.” Um lugar inédito tem suas peculiaridades: Agatha teve de participar de treinamentos de evacuação, pois na época, como, aliás, ainda é atualmente, as tensões entre as duas Coreias anunciavam um estalo bélico. “Nunca imaginei que passaria por situações e sentimentos muito loucos como esse, de achar que vai ter guerra, achar que uma bomba vai cair na minha cabeça. Não me imagino passando por isso no Rio de Janeiro, com alguém vindo dizer: ‘Ó, ferrou, a galera tá chegando aí e vai invadir’.”

Mas nem tudo foram más loucuras na terra de Psy e Shin Kyung-Sook. Agatha participou do clipe de “Shut up!”, da banda U-Kiss, um dos fenômenos do k-pop. “Foi muito louco, porque eu era uma anônima e de repente, sem entender nada, ganhei vários seguidores do mundo inteiro. Só depois percebi que existem muitos fãs de bandas coreanas ao redor do mundo, é um nicho que a gente desconhece.”

Bichinho do teatro

De volta a seu cais seguro, o Rio, Agatha ainda molhava o indicador com saliva e sentia o titubeio dos ventos de seu horizonte. “Quando terminei o colégio, minha decisão foi continuar viajando o mundo, porque eu não sabia o que queria fazer. Não queria prestar vestibular e fazer uma faculdade que pra mim não faria sentido. Eu sabia que uma hora ia descobrir o que realmente queria fazer pro resto da minha vida. Enquanto isso eu tinha uma forma de ser independente, tinha a carreira de modelo como álibi. Mas então aconteceu aquele ensaio”, ela conta.

A história é a seguinte: Agatha foi assistir ao ensaio da peça de uns amigos, Os sete pecados capitais, no teatro Suassuna. Sentou-se na plateia, mas essa não era a ideia da diretora, que no sopro decisivo, aquele que mudou definitivamente o norte da ventania para onde lufariam os sonhos de Agatha, a convidou para subir no palco. “Ela me chamou para fazer todos os exercícios e então me deu um personagem. Para participar dos ensaios, tinha que ir de Olaria até a Barra da Tijuca num ônibus lotado, bem na hora do rush. Mas ia feliz da vida! Ali, o bichinho do teatro me picou. E fiquei pensando: ‘Como eu não tinha pensado nisso antes?’. Ali eu soube que era aquilo que eu queria fazer: eu não queria largar o teatro.”

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Agatha traçou planos para fazer um curso de interpretação, mas os bolsos estavam vazios e ela estava em casa, sossegada, finalmente. Os dias de calmaria, no entanto, por vezes nos contam que é preciso desancorar, levantar as velas e soprá-las, é preciso se apossar do timão – Agatha tomou a decisão de fazer uma última viagem como modelo. O destino: Nova York. “Ficaria lá o tempo que fosse necessário para conseguir juntar uma grana e voltar pro Rio para estudar.”

Mas os meses se passaram e tudo que Agatha conseguiu juntar foram boletos. “O mercado estava bem ruim pra mim, não foi como imaginava. Aí surgiu o teste para Malhação, mas pensei que provavelmente receberia um não. Como não tinha condições de pagar uma passagem e ir até o Projac, resolvi fazer um vídeo, lá em Nova York mesmo, e mandar pra eles.” Aprovada poucos dias depois para o papel de protagonista, e com o pedido para que retornasse ao Rio imediatamente, ela correu até uma rua do Brooklyn em frente à sua casa, sentou na calçada e chorou: “Posso me dar muito mal, mas vou me jogar de cabeça, é uma oportunidade única”. 

Nova velha rotina

Daquele pranto até hoje já foram cinco novelas na Globo – incluindo Verdades secretas, que a alçou ao sucesso com a vilã Kika –, e a sexta está engatilhada. “Não gosto muito de rotina, e meu trabalho na televisão me dá todo dia algo diferente, uma cena diferente, um roteiro de gravação diferente, e isso pra mim é o melhor dos mundos”, diz. Também participou de dois filmes, ambos com lançamento previsto para 2018. No longa Pixinguinha – um homem carinhoso, Agatha interpreta a dançarina parisiense Gabriela, por quem o compositor se apaixona. “É como se fosse um amor de verão, logo ele tem que ir embora e a deixa lá.” Já na comédia romântica Missão cupido, sua personagem é uma velha conhecida da humanidade: a morte. “É uma personagem muito pragmática, que está aqui há milhões de anos, e por isso tem muita preguiça, pouca paciência, e isso faz ela ser bem engraçada.”

O sucesso deu a Agatha visibilidade e, ao mesmo tempo, um ancoradouro e um norte, o que tem suas consequências: “No início é muito estranho, no restaurante está todo mundo te olhando, pessoas completamente desconhecidas vão falar com você de uma forma muito íntima, porque você está ali, na casa delas, todos os dias. Só aos poucos é que a gente vai entendendo. Mas a mudança mais drástica foi minha vida no Rio: eu vim morar na Barra, criei novos amigos – claro que meus melhores amigos de infância continuam sendo meus melhores amigos, e sempre vão ser, mas essa mudança de rotina foi radical”.

Créditos

Imagem principal: Brunno Rangel

Brunno Rangel

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