Emergência visual
Robôs inteligentes? Simuladores de criaturas? Fomos até o Itaú Cultural tentar entender o "porquê" dessas novas formas de arte
À primeira vista, a fileira de bastões de neon que ficam se mexendo de um lado para o outro pode parecer apenas uma peça de decoração “new rave”. Logo em frente, vários monitores entretêm adultos e crianças, que perdem horas criando dinossauros high-tech. E é só dar meia-volta que um carrinho de controle remoto com canetinhas coloridas amarradas faz uns riscos em um papel em branco. Mas o que parece algo tão simples e sem importância aparente esconde anos de estudos, incansáveis testes - tendências de como a tecnologia e a arte vão caminhar nos próximos anos. Todas essas parafernálias tecnológicas citadas acima fazem parte de apenas um andar, dos três reservados para a quarta edição da bienal internacional de arte e tecnologia, Art.ficial 4.0.
Os robôs inteligentes do Performative Ecologies
Só para deixar claro, as luzes new rave fazem parte da obra Performative Ecologies, do inglês Ruari Glynn, e trata-se de uma comunidade de robôs que competem pela atenção da platéia. Mas como? “Eles têm alguns padrões faciais e gestuais pré-programados. E, para cada pessoa que algum deles consegue chamar a atenção, é registrado o que foi feito pra chamar a atenção e a maneira como a pessoa respondeu em frente à câmera, e esse registro é passado para os outros robôs. Daqui a uns dois ou três meses eles vão estar bem ensinados, sabendo o que fazer pra chamar a atenção de quem passa”, explica Ruari. Então quer dizer que se alguém parar na frente de um robô e der uma sambadinha ele pode responder sambando também? “[Risos] Sim, claro. Aliás, a maior dificuldade que eu tive com essa instalação foi como identificar o comportamento e as feições dos brasileiros. Não é igual na Inglaterra, onde você olha para uma pessoa e sabe que ela é inglesa. Aqui no Brasil a mistura é tão grande que dificulta esse processo, por isso os robôs vão ter que coletar muitos dados”, complementa.
Spore, novo jogo de Will Wright é a grande novidade da bienal
O tal dinossauro high-tech é uma prévia do jogo Spore, de Will Wright, criador de games clássicos como SimCity. A vontade das pesssoas de brincarem de criar seres misturando características de DNA e ver o bichinho evoluindo é tamanha que uma lista de espera barrava os mais empolgados que já se amontoavam em volta dos teclados e dos monitores. Não foi difícil flagrar uma pobre criança dormindo no sofá, enquanto o pai se recusava a parar de jogar. Mas a fila de espera pôde ser amenizada pela perfomance do RAP3, o “robô artista”, que realiza pinturas abstratas e decide quando é hora de parar e assinar a obra. Movimento intenso em volta e o robô exibido já estava com uma exposta na parede.
Nada de bactérias ou coisas do tipo, apenas caixas de som que dão nó na
cabeça dos visitantes
E como o buraco é sempre mais embaixo, os dois andares subsolos do Itaú Cultural abrigam algumas obras mais interativas como a The Bacterial Orchestra dos suecos Olle Cornéer e Martin Lübke, em que células sonoras captam e armazenam o som do público, construindo uma orquestra infinita. É exatamente aqui que o tema “Emergência!”, que rege as obras da bienal, fica escancarado. Como a resposta do áudio dos microfones não é imediata e sai apenas depois de alguns segundos e de algum lugar inesperado da sala, não foi difícil flagrar pessoas dando tapinhas nos microfones para ver se estavam funcionando. Além das instalações, outro destaque no mínimo intrigante foi a palestra do artista colombiano Santiago Ortiz, que prometeu ativar o caos criativo das pessoas com uma Cerimônia Xamânica para Acordar o Deus Caos.
Mas nada de coisas de outro mundo ou rituais, “É basicamente tentar encontrar um padrão e uma ordem na rede social. Achar um sentido no meio de algo que parece disperso. E já tivemos duas idéias bem definidas, como, por exemplo, um aluno que representou graficamente a ordem em que as teclas de um teclado são digitadas”, diz Ortiz, contente pelos resultados concretos de sua cerimônia.
A bienal Art.ficial consegue a difícil tarefa de representar visualmente a urgente necessidade de absorver a avalanche de informações que os meios digitais nos proporcionam nos dias de hoje. Se você for visitar a exposição, só tome cuidado para não enfiar a cara no vidro da instalação Reler, da arquiteta Raquel Korgan. Vá até lá e você vai entender o que estou falando.
Mais infos: www.itaucultural.org