Em transformação
"A tecnologia da informação embotando mentes e derrubando ditaduras ancestrais"
Esta é a nossa edição com a cobertura da cerimônia do Trip Transformadores. Ela registra o momento em que nossas crenças e visões afloram, se materializam, se tornam ainda mais visíveis e claras. O Prêmio Trip Transformadores nasceu em 2007 para ser uma forma de celebrar os nossos 20 anos, que estivesse à altura da nossa enorme pretensão desde a fundação, em 1986. É que a gente nunca quis ser só um veículo de comunicação, mais uma revista, ou uma grande empresa, uma corporação... nem nada parecido. O que a gente queria era dar a nossa contribuição para refletir e atuar na transformação do nosso mundo.
Este ano, acho que podemos dizer que estamos fechando um ciclo importantíssimo, completando 25 anos de vida de maneira muito nobre e digna. Mês passado lançamos uma Trip inteiramente dedicada a tratar do tema diversidade sexual. Uma edição que tinha um objetivo ao mesmo tempo bem simples e pretensioso: contribuir para diminuir, pelo menos um pouco, o sofrimento de milhões de pessoas que ainda padecem das mais diferentes injustiças e preconceitos por conta da orientação sexual.
Posso dizer sem medo de estar exagerando, e sem nenhuma falsa modéstia, que entre tantas coisas incríveis que tivemos o privilégio de conhecer e publicar nessas duas décadas e meia, essa foi a edição e a capa que mais fortemente reverberaram, num alcance muito amplo e vigoroso.
Claro que o mundo digital em rede multiplica geometricamente tudo, mas como sabe quem realmente atua no ambiente digital, só o que realmente tem força se difunde. Algumas das mais importantes lideranças no ativismo antipreconceito do país escreveram, declararam e publicaram que o efeito dessa edição da Trip é histórico no combate ao preconceito doentio e à homofobia que incrivelmente não é tratada como um crime no Brasil.
Falando em orgulho, soubemos há alguns dias que entre os milhares de trabalhos inscritos no prêmio mais tradicional e importante do jornalismo brasileiro, o prêmio Esso, há apenas cinco finalistas na categoria que premia criação em revistas. Desses cinco, dois são da Trip e um é da TPM.
Tanto a Trip quanto a Tpm, que aliás também está agora fechando um ciclo importante completando seus dez anos de vida, já tem cada uma o seu prêmio Esso. Mas quis dividir com vocês esse orgulho de ver que um grupo de comunicação totalmente brasileiro e independente, tem três dos cinco trabalhos escolhidos como os melhores pelos próprios colegas profissionais de comunicação. (*)
Se queríamos refletir sobre o mundo e ajudar a transformá-lo num lugar melhor, difícil imaginar um tema melhor para esta edição da Trip. Ela se propõe a lançar um olhar amplo sobre o que tudo indica ser o maior e mais complexo processo de transformação pelo qual este planeta já passou nos últimos séculos. Enumerar os indicadores que poderiam servir para reforçar essa tese seria um trabalho infinito. Ele teria que passar pelo mais óbvio, como a migração do poder das corporações para os indivíduos; as assustadoras mudanças (e catástrofes) que se abatem sobre o meio ambiente; o deslocamento dos chamados eixos de poder de potências como a Europa e os Estados Unidos para lugares antes impensáveis como China, Índia e Brasil; a tecnologia da informação embotando mentes por um lado e por outro ajudando a produzir coisas como o fim de ditaduras ancestrais espalhadas pelo mundo; até indicadores mais sutis como a expansão da capacidade das máquinas que podem substituir o trabalho humano em larga escala; as evoluções da ciência e da neurociência que podem nos libertar da escravidão do corpo e estender a vida humana a limites antes improváveis confrontadas com as enfermidades cada vez mais complexas e endêmicas que assolam multidões e uma série interminável de aspectos que provariam ser esta uma das transições mais incríveis na história recente da humanidade.
Mesmo sabendo se tratar de uma tarefa inalcançável, não deixamos de enfrentar o desafio de sobrevoar e dar rasantes sobre este riquíssimo momento em que nos metemos todos. Uma das nossas tentativas foi reunir pela primeira vez duas das mais respeitadas e notáveis cabeças pensantes atuando no Brasil, o neurocientista Miguel Nicolelis e o psicólogo e psicanalista Contardo Calligaris. No debate, que funcionou como evento de aquecimento para o que se viu dois dias depois no Trip Transformadores, entre muitas ideias originais e instigantes, pairou uma espécie de pensamento paradoxal, uma encruzilhada que pode resumir bastante bem o momento em que estamos. Se por um lado o mundo parece muito melhor do que quando a Trip nasceu, 25 anos atrás, por outro a ele se impõem alguns desafios tão complexos que pode ser pedir demais às nossas limitadas capacidades entender e administrar. Mesmo assim, se há algo a fazer, é refletir sobre eles. E é essa mais uma vez nossa tentativa com esta Trip.
Paulo Lima, editor
P.S. Na próxima edição comemoraremos nossos 25 anos em grande estilo, com o quarto ensaio sensual da nossa entrevistada deste mês. Luana Piovani nua e linda aos 35. Em dezembro nas bancas.
(*) Update: A Trip ganhou pela segunda vez o maior prêmio da imprensa brasileira