Eles vão de bike
Um homem e uma mulher trocaram os meios de transporte mais usados para viajar de magrela
Cicloviajantes dão dicas para quem quer chegar até o destino pedalando na magrela e contam alguns perrengues que passaram pelo caminho
Felipe Schlossmacher Cariello, de 22 anos, pedala desde pequeno, mas se inspirou para encarar maiores distâncias quando conheceu uma alemã que viajava de bike pelo Brasil no Encontro Nacional de Comunidades Alternativas, que aconteceu em 2011 em Aratuípe, na Bahia. Ele gostou da ideia e decidiu comprar uma bike na feira do rolo de Salvador. Pagou 60 reais por ela e começou a pedalar sozinho com destino à Maragogi, litoral norte de Alagoas. O percurso tem aproximadamente 800 km, mas Felipe acredita ter percorrido um pouco mais. “Calculo que por volta dos mil, já que para visitar as praias tive de pegar estradas de uns 20 km cada. Mesmo sem preparo físico, meu corpo aguentou bem os 80 km diários”.
Durante os 15 dias que levou, fez algumas paradas para dormir. Sem maiores preocupações, entrega que “qualquer canto coberto era lugar pra esticar a lona, entrar no saco de dormir e pronto”. E quando diz qualquer canto, é qualquer canto mesmo. Felipe se acomodou entre as cadeiras de um restaurante em um posto de gasolina, enquanto por outros dias dormiu embaixo de uma ponte, ambos na BR. Também passou dois dias em um assentamento do MST, uma noite em uma chácara da UDV [União do Vegetal, igreja que faz uso de Ayahuasca] e outra na varanda de uma casa na beira da praia. Em uma das noites dormidas embaixo da ponte, acordou com um homem o ameaçando com um facão e querendo saber o que ele estava fazendo ali. O susto foi grande, mas depois de se explicar, ficou tudo bem.
Trip Qual a vantagem de ir pedalando?
Felipe Você consegue aproveitar cada quilômetro de estrada e a admirar a paisagem, além de estar praticando exercício e não poluindo o ar. E o melhor, é de graça.
Quais dicas você daria pra quem quer viajar de bike? Eu diria que o ideal é pedalar durante o dia e descansar durante a noite. Também é bom revisar tudo antes de começar; corrente, banco e freio. Além disso, se for passar vários dias na estrada, é importante levar equipamento de camping e ter um bagageiro na bike pra carregar a mochila. Pra comer, cuscuz é uma boa. Além de barato, oferece a energia que você vai precisar. Arroz também é muito fácil e rápido de fazer. Para beber, café com leite em pó, dá muita “sustança”. Mas a maior dica é perder a vergonha, não ter medo de tocar na campainha de um desconhecido e pedir para encher o cantil, ou dormir na varanda. Fui muito bem recebido na casa de várias pessoas. Para as paradas, os postos geralmente têm banheiro com chuveiro para os caminhoneiros.
"[...] a maior dica é perder a vergonha, não ter medo de tocar na campainha de um desconhecido e pedir para encher o cantil"
A designer Renata Cardamoni, de 24 anos, usa a bicicleta como principal meio de transporte desde 2011. Saindo de São Paulo, fez seu primeiro passeio até Santos com alguns amigos. Depois desse episódio, se sentiu segura para outros trajetos e a sensação de pedalar na estrada foi tão boa que acabou indo para o Guarujá, Sorocaba, Guararema e São José dos Campos dessa forma. Em outra viagem, que dividiu o caminho usando ônibus, foi de Paraibuna a Ubatuba – o maior trajeto que já fez até hoje. Mesmo quando não pretende pegar estrada pedalando, leva a magrela no bagageiro do ônibus para não se arrepender e poder usá-la ao chegar em seu destino.
Cachoeira é parada obrigatória, por isso Renata acha importante sempre ter um mapa em mãos e anotar pontos de referência. A maioria das viagens que fez estava acompanhada com amigos, mas também já se aventurou sem eles. “As pessoas falam o tempo todo que para mulher é perigoso, inclusive sentem dó de você por estar sem companhia. No Carnaval viajei sozinha, calculei mal o tempo, choveu e acabei pedindo uma carona na estrada, com a bike - e eu - toda suja de lama”, conta.
Quando perguntamos quando saber se está pronto para arriscar os muitos quilômetros, ela ri e diz “você está pronto quando resolve desviar o caminho de casa para pedalar mais”.
Trip Qual a vantagem de ir pedalando?
Renata Você sente cada pedacinho do percurso. O nascer do sol é um dos momentos imperdíveis!
Quais dicas você daria pra quem quer viajar de bike? Revisar bem a bike e ter estratégias, as vezes é preciso pedir carona se acontecer algum perrengue. Aqui em São Paulo tem o trajeto da Serra da Cantareira, que pode ser um bom teste para saber se está pronto para viajar por mais tempo. Leve o mínimo possível, mas o máximo necessário. É importante sempre ter um corta-vento, capa de chuva, óculos de sol e ficar esperto com o clima. Frutas secas e amendoim são perfeitos para o lanche. Pare onde se sentir acolhido, seja pela natureza ou pelas pessoas. Tem muita gente boa disposta a ajudar.