Deus de mãos dadas com a ciência
Pode um religioso que acredita no criacionismo ensinar ciências sem acreditar em Darwin?
Não é surpresa para ninguém que algumas coisas na vida parecem seguir a inexorável máxima do “para que simplificar se é possível complicar?”. Uma dessas coisas, desses temas que se enroscam em uma roda sem fim, é a eterna (antiga?) discussão entre criacionistas e evolucionistas. O ano que passou, centenário do nascimento de Charles Darwin, ajudou a fustigar os ânimos adormecidos pelo tempo.
Criacionistas, como você sabe, acreditam que o homem foi criado por Deus à sua imagem e semelhança. Assim está escrito na Bíblia e, como o livro é sagrado, tudo o que está escrito nele também o é. Já do outro lado do ringue, os evolucionistas acreditam que o homem descende dos primatas (ou dos caramujos, confesso que até hoje não entendi muito bem, mas vendo o comportamento de alguns humanos não duvido de nada). Com o tempo e um pequeno empurrão do Homo erectus, chegamos ao que somos. E, atenção, por favor, Homo erectus não é nenhum tipo de preferência sexual, é apenas a designação acadêmica do ser humano um pouco depois do estágio da macaquice. Enfim. O que temos para hoje, no fim da linha, é religião e ciência em lados opostos. E que cada um faça, acredite no que quiser.
Biólogos evangélicos
Em O Estado de S. Paulo de 2 de novembro último, li uma matéria de Márcia Vieira sobre o dilema que vários biólogos encontram, por serem também evangélicos. Estudaram, fizeram mestrado e hoje a academia pergunta: como um religioso que acredita na teoria da criação pode ensinar ciências sem acreditar em Darwin?
Para mim, que não sou acadêmico nem evangélico, não tem problema nenhum em acreditar nas duas coisas. E talvez o meu pensamento possa ajudar esses biólogos em dúvida. Sou um homem que acredita, que tem fé. E me parece que as duas coisas se complementam. Explico. O fato de Deus ter feito o homem à sua semelhança em sete dias não quer dizer, necessariamente, que os dias bíblicos tenham 24 horas. Penso que podem ser anos, ou séculos. O que seja. Poderia fazer um pequeno sofisma aqui e dizer que, pelo andar da carruagem, pode-se imaginar que esses sete dias não tenham nem passado ainda. O mundo não estaria pronto. Acho que não custaria nada, até ajudaria, se a fé e a ciência pudessem andar de mãos dadas. Isso sim seria fantástico.
Mas não quero provocar mais marolinhas. Faço apenas um pequeno parêntese, um parêntese final, para perguntar a quem interessar: vai começar tudo de novo no centenário da morte de Darwin? Me poupem, por favor, e não aluguem mais espaço no meu cérebro. O mundo já é complicado o suficiente.
*J. R. Duran, 55, é fotógrafo e escritor. www.twitter.com/jotaerreduran