Desonestidade

O que posso fazer? Sinto-me indignado; roubado e obrigado a me calar. Aconselhem-me

por Luiz Alberto Mendes em

DESONESTIDADE

 

Semana passada passei maior sufoco. Meu filho mais velho, Renato, 14 anos, todo entusiasmado, subiu aqui em casa com um panfleto da SKAY para televisão a cabo pré-paga. Estava dentro de meu orçamento, cerca de 54 reais mensais, fora antena e componentes. Quando ele voltou da escola, fomos ver de perto.

Um homem gordo e risonho nos atendeu. Sabia que aquela simpatia tinha a ver somente com vendas, mas como é bom ser bem tratado, relaxei e escutei. Em momento algum falou do plano mais barato que me interessava. Por minha vez, fui descartando tudo o que ele apresentava. Percebi em seus olhos que ele tentaria algo mais ousado. Perguntou para meu filho quantas televisões havia em casa. Duas na casa de sua mãe e uma na minha. Então tirou da cartola plano que me comprometia. Dois pontos, um para a minha e outro para a televisão dos meninos. O preço ficou proibitivo. Cerca de 80 reais mensais. Os olhos de Renato me atravessaram parecendo farol de milha cortando neblina. Pensei e me decidi; que se dane, nós gostamos e ainda havia o irmão dele em casa com 10 anos que é fascinado por desenhos. Vamos nessa, pensei, a gente se vira depois e paga.

Nem olhei muito o contrato para não desistir. Havia duas clausulas estranhas. Na primeira queria me cobrar 10 reais (falou em taxa de manutenção. Mas que manutenção? De aparelho novo?) pela garantia do produto que me vendia. Não era venda, afirmou, e sim comodata. Não aceitei. A outra é que o pagamento da primeira mensalidade seria no ato. Então era pré-pago ou estava pagando o modem do pré-pago? Essa passou rasgando, mas foi. Achei que meus garotos mereciam, não muito, mas.

Dia seguinte, estava na condução, quando fui acionado pelo garoto. Estavam colocando a antena e o equipamento em casa, só que havia algum engano. Conversei pelo celular com o encarregado pela instalação. A autorização era para um ponto somente e não dois. Deixou o telefone do setor que cuida dessa parte da SKAY e o dele. Caso o engano fosse desfeito, ele voltaria para colocar o outro ponto.

Cheguei em casa e o moleque esperava no portão. Enquanto não peguei o telefone para ligar, não sossegou. O contrato, esclareceu a atendente, era mesmo somente para um ponto. Para dois pontos o preço subia a quase dobro do proposto. Fora de minha realidade. Faz mais de 5 anos que fora das grades e até agora não consegui trabalho fixo. Vivo e sustento os meus com minhas correrias. Dizem que sou empreendedor. Nada; sigo a maré como todo mundo, economizando e sobrevivendo. O vendedor havia me enganado, vendeu um ponto por dois. Para mim somente, não pagaria o que o contrato prescrevia. Ficaria com o pré-pago de 54 reais. Agora não queria mais. Desisti principalmente por haver sido enganado. Claro, disse a atendente, só havia uma multa contratual. Cerca de 500 reais. Como?! Dei pulo. Fora enganado e ainda teria que pagar por isso? Havia algum engano. Não, estava no contrato.

Desliguei o telefone e fui diretamente ao sujeito que me enganara. É distante, no caminho fui ficando cada vez mais indignado. O sujeito me roubara. Cheguei falando em voz alta. O local de vendas é na frente de uma grande loja que vende doces, encostado ao Shopping Pirajussara. O sujeito ouviu e respondeu na minha cara que havia me vendido apenas um ponto. O sangue subiu na cabeça. Meus contensores entraram em alerta máximo. A vontade era socar aquela cara gorda, fazer engolir os dentes. Agüentei e xinguei para poder aliviar a pressão.

As pessoas que faziam compras na loja pararam e nos rodearam. Estavam ansiosas para ver o circo pegar fogo. O Gerente chegou e eu afirmei que ele devia tomar cuidado porque aquele indivíduo estava enganando as pessoas ali na porta de sua loja. O Gerente chamou o sujeito encarregado da segurança da loja. Expliquei, para que todos em volta soubessem, já que tão curiosos. O sujeito tornou a dizer em minha cara que havia me vendido apenas um ponto.    

Fui para cima. O segurança enorme me conteve e se aproveitou para ir me levando para fora, segurando pelo braço. Chamei o vendedor para fora da loja e o segurança veio junto, tentando me conter. Parei e exigi que tirasse suas garras de cima de mim. O sujeito ainda tentou dominar, mas observando minha resistência, soltou. Se eu queria briga, agora ia encontrar, afirmou convicto. Sacou o celular e começou a discar. Perguntei se estava chamando polícia. Respondeu, com todas as letras, que ele era a polícia. Imaginei que fosse policial fazendo segurança como “bico”. Restava saber se era em horário de serviço. Mas fosse como fosse, estava errado. A lei não permite. Mas, sei lá se por atavismo, falou em polícia e eu fui me retirando, mesmo sendo a vítima. O gordo aproveitou-se para arrogar valentia escondida até então.

Sai de lá ferido, humilhado. Meu dinheiro é fruto de trabalho. Entro e saio de cadeia para ganhar a vida. Arrisco. O sujeito me enganou, não pude escapar, já até descontaram o primeiro mês. Além disso, o servidor público que é pago para me defender, acabou ajudando o sujeito que me enganou a me enxotar como a um cão da loja (e é exatamente por isso que existe a lei que proíbe policial de fazer “bico”; fica incompatível). O que posso fazer? Sinto-me indignado; roubado e obrigado a me calar. Aconselhem-me.

 

Luiz Mendes

24/09/2009.    

 

 

 

 

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