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Bernardo Carvalho dá voz a um personagem que intoxica o mundo virtual: o comentarista
Em seu mais recente livro, Bernardo Carvalho dá voz a um personagem que intoxica o mundo virtual: o comentarista de internet
Reprodução (Cia. das Letras, R$ 37) tem um protagonista curioso: um estudante de chinês que é detido para averiguação no aeroporto, antes de embarcar para a China, para falar de sua relação com a ex-professora de mandarim, que encontrou depois de anos na fila. Apesar de ter trabalhado no mercado financeiro, a ocupação principal do personagem é outra: comentarista de sites e blogs. É manifestando sua “opinião” (baseada na reprodução de outros discursos) anonimamente que ele espalha na rede o ódio com sua homofobia, seu racismo e seu antissemitismo. “Isso vem da minha experiência de ver uma certa ‘fascistização’ do mundo, da internet”, diz o autor, Bernardo Carvalho.
Por que essa possibilidade de ocultação de identidade envenena tanto as pessoas? É mais fácil atacar se você não corre o risco de ser atacado de volta.
Como você destilou o ódio encontrado no “discurso” dos comentaristas de blogs e sites na criação do protagonista de Reprodução? Uma das ideias por trás do romance era mostrar que ninguém está fora desse discurso. Há coisas ali dentro com as quais você tende a concordar. E é por isso que pode ser tão mais desagradável e desestabilizador. Não é só uma caricatura de um tipo abjeto. É um discurso ambíguo. O fascista da internet não é só o outro; é a gente também, em potencial.
Qual é o soro contra esse comportamento? Já que estamos falando de reprodução (e para reproduzir um velho bordão sobre a arte): “Não cabe a ela mostrar soluções, mas apresentar problemas”.