Todos se acham pessoas de paz e que as pessoas em torno delas é que são violentas. O outro é violento, nós não, nunca! Incrível como ainda conseguimos nos enganar assim depois de tanta informação que processamos. Somos produtos e produtores do que vivemos e nada do que nos cerca nos é estranho. Estamos envolvidos e até o pescoço, quer queiramos ou não. Podemos nos esconder, nos cercar de muros, sistemas de segurança, homens armados e todos os meios disponíveis de segurança pessoal. Mas, não podemos nos esquecer: nada é para sempre. Um dia a casa cai; a vida é sempre uma grande surpreza.
Podemos raciocinar que uma pessoa que viva na favela, tenha passado por preconceitos, descriminações, imensas dificuldades econômicas, habite em condições precárias, fique desempregado mais vezes, seja mais frágil e tenha mais facilidade de deixar-se seduzir pela violência. Mais do que uma pessoa educada nos melhores colégios, que viva em uma casa digna do nome e dentro de uma família esclarecida. A violência é cultura, mas a agressividade é condição humana. É só observar os crimes cometidos por adolescentes da classe média. São filhos matando pais, avós, tios; psicopatas nascem em todas as famílias. Eles não escolhem famílias pobres ou ricas para nascerem; são filhos da necessidade de nascer.
Nem sei se devemos tratar a vida com todo esse cuidado ou se devemos expremê-la fortemente, qual a um limão e obter dela todo seu sumo. Do pouco que sei, o tempo é o senhor de nossos dias e talvez o pior dos males que possamos cometer contra nós mesmos seja desperdiça-lo. Ele é todo nosso tesouro; cada passo, cada palavra, não voltará. Particularmente a massa do que queríamos dizer e não dissemos; ainda faz um barulho tremendo e repercute nas paredes interiores de nosso ser.
Com que dificuldade recebemos os outros em nossas vidas… E o outro é espaço vazio que se abre para nós. O silêncio com que nos escuta e as palavras com que nos acolhem. Ele é a nossa melhor companhia, onde podemos nos esvasiar ou preencher de significados. Na verdade o outro é todo o significado existente na vida. Que seria de nós sem os outros? Não seríamos. São as outras pessoas que dão sentido a tudo o que fazemos. Pode até parecer que muita coisa nos separa do outro. Mas se observarmos o que nos une às outras pessoas, ficaremos estupefatos em perceber que quase tudo nos une e o que pode nos separar, somos nós mesmos.
Depois de quase um ano isolado em uma cela forte, sai sentindo na pele a necessidade de estar com os outros, mesmo que esses outros não fossem a melhor companhia do mundo. Eu me interessava até pelas dobras da pele do rosto das pessoas.Ouvia cada uma de suas palavras qual houvesse uma magia eles falarem e eu compreender. Mulher então, eu as absorvia como uma esponja, pelos olhos. Seus gestos mínimos eram autêntica magia para mim. A cultura feminina sempre foi um doce mistério e decifrá-la tem sido um prazer enorme.
Hoje já me perco um pouco a gastar meu tempo mais dispersivamente. Mas até isso pode fazer bem; enchergo a vida com mais serenidade,sou menos exigente e muito mais generoso com as pessoas. Isso me faz enorme bem.
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