Com licença, Excelência
Será possível despertar um mínimo interesse político nas pessoas com tanta maré contra?
Tudo na vida pode ser analisado levando-se em conta a forma e o conteúdo. Às vezes temos bons conteúdos sem a roupagem ideal para serem percebidos e outras vezes, muito estilo e marketing para esconder pouca essência. A política é uma das áreas em que essas duas vertentes estão absolutamente deterioradas. A picaretagem, os maus exemplos e a ausência de ideias novas e projetos que representem uma verdadeira mudança caminham lado a lado com uma linguagem velha e ultrapassada, repleta de bordões, e uma imagem associada a privilégios e regalias.
O Brasil é o país das excelências e, infelizmente, não estou falando de especialidades em alguma área de conhecimento, mas sim do gosto da nossa elite por títulos rebuscados, palavras pomposas e a utilização de um português arcaico que compõem a liturgia do poder. É tudo muito chato. Lembro de assistir a audiências na Câmara Municipal de São Paulo e quase enlouquecer com a quantidade de besteiras que cada um dos vereadores tinha que falar para se dirigir a outro ou para tratar de algum tema. Era uma coleção de “nobre colega” pra cá, “Vossa Excelência pra lá”. Devem gastar florestas de papel para transcrever as baboseiras dos discursos.
Confesso que, nesse aspecto, sinto uma ponta de inveja dos americanos, que simplificam tudo e parecem zelar pela busca de informalidade nas relações político-institucionais. Por lá, o “you” pode ser ouvido nas mais altas cortes judiciárias, câmaras legislativas, entrevistas com poderosos e mesmo na Casa Branca. O “você” está presente no dia a dia, e isso ajuda a aproximar as pessoas das esferas de poder.
Festival de bandeiras
Um projeto de transformação da forma de nossa política, para torná-la mais acessível e simples em todos os níveis, compõe um dos pontos fundamentais desta coluna. É necessário mudar completamente os regimentos internos do poder que regulam títulos, nomenclaturas e bobagens que só colaboram para o pela a política. Ao lado disso, precisamos facilitar o acesso para os interessados. A filiação a um partido e a definição das candidaturas são processos relativamente simples e que são tratados como algo muito difícil e penoso, quase inatingível, justamente para que ninguém ouse se aproximar.
Nos últimos meses, os escândalos do Congresso Nacional provocaram diversas opiniões de jornalistas e analistas respeitáveis sobre a necessária renovação política. Na opinião de todos eles, quase nenhuma mente brilhante e idealista se arrisca na vida pública, e a caneta acaba ficando nas mãos dos mesmos de sempre.
Será possível despertar interesse político nas pessoas com tanta maré contra? Com conteúdo sério e forma atraente, sim. É assim em todas as áreas da vida e não pode ser diferente na política. As excelências que nos deem licença.
*Alê Youssef, 33, é sócio do Studio SP e foi um dos idealizadores do site www.overmundo.com.br. Seu e-mail é ayoussef@trip.com.br