Clipe Soldado do Morro do MV Bill (Traficando informação)
Veja o que a censura não viu, o clipe do MV (Mensageiro da Verdade) Bill. Soldado do Morro.
Alex Pereira Barbosa nasceu há 26 anos na Cidade de Deus, um dos bairros mais violentos do Rio de Janeiro.
Viveu uma infância igual à de muitos favelados: foi office-boy, jornaleiro, flanelinha, estoquista, entregador - e por fim, como vários amigos seus, soldado do morro.
A fim de denunciar a situação de crianças e adolescentes que trabalham como soldados para o narcotráfico, Alex, que se tornou o rapper MV (Mensageiro da Verdade) Bill, filmou seu novo clipe em pontos-de-venda de drogas localizados em favelas brasileiras.
Só poupou a Cidade de Deus, por ser a sua quebrada. Independente, a produção casca-grossa não pesou no bolso por um motivo simples: armas, munição e drogas são parte integrante do cotidiano do casting.
TRIP: De que trata o clipe?
MV BILL: Do dia-a-dia dos jovens nas favelas. Para as coisas do mal você tem vários convites. Para o bem, eles são escassos. Muita gente só pensa em criticar quem mora na favela e teve que partir para o arregaço. Claro que o fato de não ter tido oportunidade não justifica o crime. Mas a favela só precisa de justiça e dignidade.
TRIP: Você já trabalhou no tráfico?
MV BILL: Não considero traficante quem planta coca descalço na Colômbia nem quem está na comunidade com o fuzil. Os verdadeiros traficantes estão fora das favelas. Não fui mais que um simples soldado. Muita gente pensa que só o viciado é dependente químico - mas creches, associações de moradores e bailes comunitários também são, pois recebem ajuda do tráfico. Se dinheiro sujo for usado para comprar leite para uma criança, passa a ser limpo. Ou seja: pra ser soldado, não precisa estar de fuzil na mão.
TRIP: O que o tráfico faz pela comunidade?
MV BILL: Não estou aqui pra defender o crime. Mas não sou contra os traficantes porque eles foram criados comigo, são pessoas como eu. Apesar de eu ser contra o tráfico de drogas, reconheço que ele é um meio de sobrevivência para um monte de gente. Se eu falar para um moleque sair do tráfico e ir trabalhar de office-boy, ele ganhará R$ 151 por mês, em vez de R$ 400 por fim de semana - você acha que ele vai querer?
TRIP: Seu irmão está envolvido com o tráfico?
MV BILL: Tenho um irmão mais novo que, infelizmente, está num caminho diferente... [pensa] É complicado falar nisso. Nós nos respeitamos, trocamos idéias... mas também não tenho algo melhor para oferecer a ele.
TRIP: O clipe mostra armas pesadas, drogas e dinheiro dos traficantes. Como você acha que será a repercussão?
MV BILL: O problema da TV brasileira é que preto, favelado, pobre, nordestino e índio são excluídos. Brigo por esse povo, que sempre construiu a porra toda e nunca teve acesso a nada. Vejo muita gente tentando retratar o trabalho escravo no sertão, mas um dos maiores trabalhos escravos no Brasil está aqui: crianças co-optadas pelo tráfico de drogas.
TRIP: E a reação dos traficantes?
MV BILL: Como não vou xisnovar [dedurar] a vida de ninguém, não vai ter problema: só chamo a atenção para a real.
TRIP: No caminho para esta entrevista, você tomou uma dura da PM, junto com o repórter e os diretores do clipe. Qual sua opinião sobre a polícia?
MV BILL: É um órgão de repressão. Em vez de proteger, aterroriza o cidadão. Se estivessem só vocês três, brancos, seriam revistados, mas não com a mesma violência e ironia. Fui sufocado. Os caras tentam me apavorar por causa das coisas que falo. Infelizmente, já estou até acostumado a receber dura.