Milton Hatoum, um dos principais escritores brasileiros, planta abaixo comentários sobre Lavoura Arcaica. O filme de Luiz Fernando Carvalho baseado na obra de Raduan Nassar chega este mês ao DVD com documentário inédito sobre as filmagens
Não é comum um grande livro de ficção inspirar um grande filme. Mais raro ainda é o diretor do filme aceitar o desafio do texto e transformá-lo também numa aventura da linguagem. Quem assistir a Nosso Diário [documentário de quase uma hora sobre a filmagem de Lavoura Arcaica, que vem como extra no DVD] vai encontrar uma lição de cinema, o que vale dizer: uma lição de profissionalismo sobre o fazer cinematográfico. Além da conversa entre o organizador do festival de Montreal, André Paquet, e o cineasta Fernando Solanas, ressaltam os depoimentos de toda uma equipe movida pela pesquisa e pelo amor à matéria filmada. Amor? Penso que ali há um estado de transe, de graça, tamanho é o envolvimento entre o texto e o que será filmado.
Essas duas coisas [construção e drama humano] são os pilares da prosa poética de Raduan. Não é outra a perspectiva do filme, cuja cartografia da alma é desenhada pelo olhar do diretor e de toda a equipe. Na difícil travessia da palavra para a imagem, Lavoura Arcaica recupera a essência do texto, valorizando o que há de mais poético e dramático de uma linguagem à beira do abismo.
O amazonense Milton Hatoum, 53, é autor de três romances: Relato de Um Certo Oriente e Dois Irmãos [vencedores do Prêmio Jabuti], e do recém-lançado Cinzas do Norte [Companhia das Letras, 312 págs., R$ 39], que narra a história de dois amigos que se distanciam e tomam caminhos diferentes durante a ditadura militar
